Mudanças ameaçam Programa de Alimentação do Trabalhador

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Se não incluir proibição de rebate para todos os tipos de vale e auxílio-alimentação, nova regulamentação porá em risco programa que beneficia mais de 22 milhões de brasileiros
O Brasil está concluindo um processo para modernizar e aperfeiçoar o Programa de Alimentação ao Trabalhador (PAT) que, por meio de benefícios fiscais aos empregadores, garante vales para as refeições dos trabalhadores. Entretanto, em meio a muitas mudanças positivas, como a introdução de novas tecnologias de pagamento, o projeto em discussão no Executivo pode reduzir o poder de fiscalização do governo federal, manter práticas abusivas e anticoncorrenciais e ainda desidratar o PAT. Em setembro deste ano, a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) enviou uma nota de preocupação ao ministro do Trabalho e Previdência, Onyx Lorenzoni, em cujo ministério estão se dando as discussões.

Instituído em 1976, o PAT é um programa que prevê dedução do Imposto de Renda sobre o lucro das empresas que oferecem vale refeição aos empregados. Além disso, o valor dos vales não entra na base de cálculo dos encargos trabalhistas. O benefício tem destinação certa, e o trabalhador só pode usar o recurso na compra de alimentos em supermercados ou refeições para consumo imediato. Atualmente, 22 milhões de trabalhadores formais são beneficiados pelo programa.

O objetivo do PAT é melhorar a qualidade nutricional para o trabalhador, daí o uso exclusivo dos vales, que não podem ser convertidos em dinheiro ou bebidas alcoólicas. Uma das mudanças previstas éa proibição do chamado rebate, prática adotada por operadoras de tíquete ou vale alimentação que consiste em dar desconto para as empresas que adquirem grandes lotes. Por exemplo, se uma empresa compra o total de R$ 2 milhões em vales (pelo valor de face), pode pagar R$ 1,8 milhão, um desconto de 10%.

O problema é que o desconto não fica com as operadoras. O prejuízo recai sobre o vendedor final (bares, restaurantes e supermercados, por exemplo), que paga altas taxas na hora de converter os vales recebidos em dinheiro. Hoje, em média, de cada R$ 100 recebidos, os estabelecimentos ficam com R$ 93. Esse deságio tende a aumentar com políticas cada vez mais agressivas de rebate.

No caso de pequenos estabelecimentos próximos a regiões industriais, os vales representam até 90% do faturamento. “Ou o vendedor repassa o prejuízo para o preço da comida, o que está difícil, devido à queda da renda no país, ou arca com ele. O Brasil é o único país do mundo em que é permitido a uma empresa ganhar algo para dar um benefício ao trabalhador”, diz Paulo Solmucci Jr, presidente da Abrasel. O rebate chegou a ser proibido por portaria do Ministério do Trabalho, em 2017, mas a Justiça derrubou a proibição, que agora volta a ser discutida.

Solmucci afirma que as mudanças em discussão são muito positivas, mas que o rebate precisa ser proibido, seja por meio de decreto ou por outro instrumento legal. Diz também que a proibição precisa atingir tanto o vale-refeição quanto o auxílio alimentação, que foi criado na minirreforma trabalhista de 2017.

A diferença entre os dois é que o auxílio-alimentação está fora do PAT e não sofre a mesma fiscalização porque também não oferece o incentivo fiscal para as empresas (redução no IRPJ).

“Se não houver a proibição do rebate no caso do auxílio-alimentação, as empresas vão migrar para esse sistema e abandonar o PAT. O desconto oferecido é muitas vezes maior que o ganho com a redução do IRPJ”, afirma.

Outro problema é que, como está fora da fiscalização, o auxílio-alimentação acaba sendo usado com mais frequência para outros propósitos, até o pagamento de plataformas de streaming, compra de bebida alcoólica ou combustível, o que desvirtua completamente o propósito do programa, que é dar aos trabalhadores acesso a uma alimentação de qualidade nutricional.

Alguns defendem que a migração do PAT para o modelo do auxílio-alimentação seria benéfica para os cofres do governo, que não arcaria com o subsídio de R$ 1,2 bilhão ao ano. Mas estudos apontam que cada R$ 1 revertido para o PAT gera R$ 2,85 em impostos diretos e indiretos ao governo, uma vez que ele movimenta uma cadeia enorme, que vai do produtor rural, passa pela indústria alimentícia e pelo setor de logística, até chegar aos bares, restaurantes e supermercados.

A Abrasel acompanha as discussões sobre as mudanças no PAT desde janeiro, quando estavam no Ministério da Economia. Com a recriação do Ministério do Trabalho e da Previdência, a discussão ficou neste último.

O atual ministro, Onyx Lorenzoni, quando deputado federal, propôs, em 2017, um projeto de lei que incluía o auxílio-alimentação no PAT, com a proibição do rebate. “Deixar o auxílio-alimentação de fora do PAT terá a força e a demonstração política de formalizar o início do fim do programa, o que, temos total certeza, não é o objetivo do Ministério do Trabalho e da Previdência”, finaliza Solmucci.

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