Ministro foi contra recriar pasta citada por petista na campanha e herdará programas que pouco avançaram
O ministro aposentado do STF (Supremo Tribunal Federal) Ricardo Lewandowski deverá entrar no governo Lula (PT) em 1º de fevereiro pressionado pela avaliação negativa da população sobre segurança pública na gestão petista e por programas que pouco avançaram na área.
A cobrança sobre Lewandowski deve aumentar ainda mais por ele ter se oposto ao desmembramento da Justiça e à recriação do Ministério da Segurança Pública —promessa de Lula ainda do período eleitoral.
O atual governo tem 38 pastas, contra o máximo de 23 sob Jair Bolsonaro (PL), 29 sob Michel Temer (MDB) e 39 sob Dilma Rousseff (PT).
Lewandowski tem apontado em conversas reservadas que a área de segurança pública será seu maior desafio à frente do ministério.
Pessoas próximas afirmam que o futuro chefe da Justiça manifesta preocupação com a gravidade do problema e promete pulso firme no combate ao crime. Nas palavras de um aliado, o garantismo que marcou sua carreira no Judiciário, com forte defesa dos direitos de acusados, não será confundido com falta de ordem em sua gestão no ministério.
As pontes estabelecidas com a classe política durante o período em que ocupou a presidência do STF e do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) também podem pavimentar articulações no Congresso, segundo aliados.
Um exemplo do bom trânsito de Lewandowski no mundo político são os elogios recebidos de Valdemar Costa Neto, presidente do PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro. À Folha Valdemar disse que o novo ministro é homem de bem e tem comportamento firme.
Diante do diagnóstico dos desafios na área, um dos postos de segundo escalão da Justiça considerados mais importantes por Lewandowski é a Senasp (Secretaria Nacional de Segurança Pública). Ele ainda não definiu quem comandará o órgão.
José Vicente da Silva Filho, coronel reformado da Polícia Militar de São Paulo e membro do Conselho da Escola de Segurança Multidimensional da USP, afirma que Lula, ao anunciar seu novo ministro, não colocou a segurança pública como prioridade —o foco seria na política e no relacionamento com outros órgãos, entre eles o próprio STF.
“O que ele fez [gestão Flávio Dino] de positivo foi relacionado à nova política armamentista, mas em relação a outros pontos da segurança a pasta virou prateleira de fornecimento de serviço, em que passou a fornecer homens das Força Nacional, armas e viaturas”, disse.
Pesquisa Datafolha publicada em 7 de dezembro apontou a segurança como o segundo tema de maior preocupação dos brasileiros. No mesmo levantamento, 50% dos eleitores avaliaram a gestão Lula nesse campo como ruim e péssima, ante 29% de regular e 20% de ótima ou boa.
O primeiro ano de Lula conviveu com crises na segurança pública na Bahia e no Rio de Janeiro, onde houve acirramento das disputas entre grupos criminosos. O caso da Bahia gerou especial desgaste político para o PT, uma vez que o estado é governado pelo partido há diversos mandatos.
Assim como Lewandowski, Dino foi contra o fatiamento do Ministério da Justiça.
No período à frente da pasta, a atuação de Dino na segurança pública foi alvo de queixas de conservadores, que reclamaram de leniência do governo, e também de progressistas, que viram prioridade na lógica de guerra às drogas.
Ao longo de 2023, o governo federal lançou diferentes programas de enfrentamento à violência, mas especialistas apontam para uma dispersão de ações e a falta de uma visão sistêmica sobre o papel do governo federal.
Além de ser um assunto que gera forte preocupação na população, a segurança pública tem ainda uma dimensão política que é frequentemente explorada por opositores, principalmente bolsonaristas. O próprio Dino foi em diversas ocasiões chamado a participar de audiências públicas no Congresso Nacional.
Um dos episódios mais abordados por opositores foi uma visita feita por Dino ao Complexo da Maré (RJ) nos primeiros meses de 2023. Bolsonaristas usaram o caso para associar falsamente o ministro ao crime organizado —a vinculação foi fartamente explorada nas redes sociais.
Adversários ainda acusam a política desarmamentista do governo Lula de desproteger a população da criminalidade.
Dino também encerra sua gestão na pasta sem que o caso da vereadora Marielle Franco tenha sido resolvido, apesar de ressaltar que será esclarecido. O diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, disse ter convicção que a instituição dará uma resposta final sobre o caso ainda no primeiro trimestre deste ano.
Procurado em dezembro para fazer um balanço sobre a área, o Ministério da Justiça informou que atua “de forma consistente a médio e longo prazo, como, por exemplo, a partir da estruturação de programas para combater as grandes organizações criminosas e proteger a Amazônia”. Segundo a pasta, foram investidos em 2023 mais de R$ 18 bilhões em segurança pública.
Fonte: Folha de SP