Entenda por que o texto é tão importante para o futuro do Brasil
SÃO PAULO – 10 entre 10 pessoas que atuam no mercado financeiro concordam que a reforma da Previdência é uma necessidade vital para o Brasil, pois somente com ela teremos o equilíbrio nas contas do governo e com isso garantir um futuro digno para as próximas gerações de aposentados. No entanto, o assunto ainda é um mega tabu para quase todo o resto da população brasileira, que por desconhecimento sobre economia, por querer a garantia de benefícios que esperava ter um dia ou simplesmente por “questões políticas” (por que não?), se dizem contra estas mudanças.Contudo, um texto de autor desconhecido e que viralizou em vários grupos de whatsapp de pessoas que trabalham no mercado pode ser uma “arma” a ser utilizada por aqueles que defendem a reforma da Previdência. Com uma linguagem clara e rápida, o arquivo de 12 páginas rebate 25 argumentos utilizados por aqueles que são contra mudanças nas regras da Previdência.
Embora o InfoMoney não tenha conseguido identificar quem é o autor desta obra, a qualidade do texto nos deixou bem confortável em compartilhá-lo com vocês, leitores e leitoras. Aos que entendem a importância da reforma, vale a pena a leitura e o compartilhamento com aqueles que pensam diferente; já aos que são contra mudar as regras da previdência, é uma oportunidade para mudar de ideia – ou pelo menos entender que quem pensa a favor da reforma não é necessariamente um “golpista”.
Confira a íntegra do documento:
1) Não existe déficit da Previdência
Essa tese é defendida por um sindicato que representa servidores de elite. A maioria se aposentando pelo salário máximo do funcionalismo (R$ 33 mil). É óbvio que esse grupo de interesse tem muito a perder com a reforma da Previdência. Em quem você acreditaria mais: nesse sindicato, ou em uma instituição pública cuja função é auditar as contas do governo, como o TCU (Tribunal de Contas da União)? Será que os auditores do TCU iriam mentir para enganar o povo? Pois bem, auditoria do TCU já mostrou que o déficit da previdência em 2016 foi de R$ 226,9 bilhões, e o déficit da Seguridade Social foi de R$ 264,9 bilhões.
Mesmo pela metodologia usada por quem diz que não há déficit, o resultado para 2016 é um déficit de R$ 57 bilhões e em 2017 será de mais de R$ 100 bilhões. Repare que quem apresenta as contas do “não existe déficit” sempre traz um histórico até o ano de 2015. Por que, se são públicos os números de 2016? Pois, se seguir adiante, vai mostrar números negativos.
Uma CPI do Senado, na qual atuaram apenas parlamentares da oposição, também disse que o déficit não existe. Mas o relatório dessa CPI não mostra em nenhuma das suas centenas de páginas qual o valor do suposto superávit, nem em 2016, nem em 2017, nem nos próximos anos. Ela apenas afirma haver superávit, mas não diz de quanto seria, nem qual seria a metodologia de cálculo. Nenhum dos participantes das audiências públicas feitas pela CPI mostrou este dado. Trata-se de simples manifestação política que visa poluir a discussão, sem qualquer fundamento técnico.
2) As pessoas vão trabalhar até morrer
Quem defende essa tese diz que a idade mínima de aposentadoria não pode ser de 65 anos, pois existem estados brasileiros em que a expectativa de vida é apenas um pouco maior do que isso. Em Alagoas e no Maranhão, por exemplo, é de 66 anos. Em média, as pessoas só ficariam aposentadas 1 ano.
Essa interpretação não faz sentido. O dado refere-se a expectativa de vida de uma criança ao nascer, faz com que a expectativa de vida em regiões pobres seja reduzida, infelizmente, pela alta mortalidade infantil e de jovens pobres em decorrência da violência. Aqueles que sobrevivem a esses episódios, e chegam à velhice, se tornando aptos a receber uma aposentadoria, têm expectativa de viver muitos anos a partir daquele momento. É esse o dado relevante para medir a sustentabilidade da previdência. Quantos anos uma pessoa de 60 anos ainda vai viver e receber sua aposentadoria? A isso se chama expectativa de sobrevida e essa é elevada tanto nas regiões ricas quanto nas pobres. No Nordeste, uma pessoa de 60 anos tem expectativa de viver até os 81 anos. No Sudeste, até os 83 anos.
3) Vai ser preciso trabalhar 40 anos para se aposentar
Errado: uma coisa é poder se aposentar, outra é quanto vai receber de aposentadoria. O trabalhador do setor privado poderá se aposentar quando tiver 15 anos de contribuição e atingir a idade mínima. A idade mínima logo depois da reforma será de 53 para mulheres e de 55 para homens. Essa idade mínima subirá gradativamente até atingir 62 anos para mulheres em 2036 e 65 anos para homens em 2038. No caso do servidor público, o tempo mínimo de contribuição é de 25 anos e a idade mínima parte dos atuais 55 anos para mulheres e 60 anos para homens, atingindo 62 anos para as mulheres em 2032 e 65 anos para homens em 2028.
Já o tempo de contribuição acima dos 15 anos para se aposentar definirá o quanto o aposentado irá receber. Os 40 anos de trabalho referem-se ao tempo necessário para receber aposentadoria equivalente a 100% do salário de contribuição (aposentadoria integral). A pessoa que se aposentar com o tempo mínimo de contribuição pelo RGPS (15 anos) receberá 60% do salário de contribuição. Quanto mais tempo ela demorar para se aposentar, maior será o valor da aposentadoria a receber. É uma regra justa: quem passa mais tempo contribuindo recebe aposentadoria maior. Com 40 anos de contribuição, seu valor atinge 100% do salário
médio de contribuição.
É preciso separar o direito de poder se aposentar do quanto se vai receber (valor da aposentadoria). Para poder se aposentar, são necessários somente 15 anos de contribuição (25 no serviço público) e atingir a idade mínima, e não 40 anos de contribuição. Com relação ao quanto se vai receber (valor da aposentadoria), na grande maioria dos países esse valor é muito menor que o do salário da ativa. A taxa de 60%, garantida para o
trabalhador que tem o tempo mínimo de contribuição e a idade mínima, já é elevada para os padrões internacionais.
Vale lembrar ainda um detalhe importante: quem recebe salário mínimo poderá se aposentar após 15 anos de contribuição, e atingimento da idade mínima, recebendo 100% da remuneração da ativa, pois o salário mínimo é o piso do benefício da previdência. Nada menos que 60% das aposentadorias pagas pelo INSS são de um salário mínimo. E elas não terão seu valor afetado pela reforma.
4) A reforma vai diminuir o valor da aposentadoria de todos os trabalhadores
Errado. Em primeiro lugar, nada muda para quem já está aposentado ou já tem direito de se aposentar. Em segundo lugar, para dois terços dos brasileiros que ainda não se aposentaram, não haverá qualquer mudança no valor da aposentadoria. Eles se aposentarão recebendo aposentadoria pelo salário mínimo (aposentadoria integral com apenas 15 anos de contribuição) porque o menor benefício da previdência é o salário mínimo. Para os demais trabalhadores, na verdade, a reforma pode até aumentar o valor do benefício, uma vez que ela acaba com o fator previdenciário.
5) A reforma da Previdência acaba com direitos sociais. Não se pode aceitar isso: nenhum direito a menos!
Quem já está aposentado ou já tem direito à aposentadoria não é afetado pela reforma. Ela não mexe em direito adquirido. Não há nenhuma retirada de direitos. Quem ainda não adquiriu esse direito, vai ter mudanças de regras proporcionalmente ao tempo que falta para se aposentar.
É preciso lembrar que o direito de um é obrigação de outros. É a sociedade que paga a conta. Não existe uma disputa entre população de um lado, querendo garantir direitos, e governo de outro, querendo cortar direitos. O governo não fabrica dinheiro. Ele paga aposentadorias e outras despesas com o dinheiro que arrecada da população, cobrando impostos.
Se a previdência não for reformada, a conta a ser paga pela sociedade vai ficar muito alta. Ter que pagar impostos elevadíssimos não seria uma perda de direito? Não seria uma perda do direito de dispor do próprio dinheiro, de ter emprego, de ter serviços de saúde e segurança providos pelo governo?
6) Estão jogando o custo do ajuste nas costas dos pobres
Errado: 75% dos atuais trabalhadores em atividade não serão afetados pela reforma. Ela está direcionada para remover ou diminuir as condições especiais e privilegiadas de aposentadoria que ainda existem hoje, principalmente para os mais ricos.
Um dos méritos da reforma da previdência é justamente o fato de ser um ajuste que pesa menos para os mais pobres. De acordo com recente estudo do Banco Mundial, quando se considera o que cada indivíduo contribui para Previdência e o que ele recebe da Previdência, o benefício líquido se concentra nos mais ricos, ou seja, os mais ricos são aqueles que acabam por receber benefícios muito superiores a sua contribuição. Os 20% mais pobres ficam apenas com 4% dos subsídios da Previdência (diferença entre o que contribuem e o que recebem), enquanto os 20% mais ricos ficam com 35%.
Não é difícil entender o porquê. Um trabalhador que ganha um salário mínimo e passa por vários períodos de desemprego ao longo da vida, só vai conseguir se aposentar aos 65 anos e deve receber o salário mínimo. Já um trabalhador de alta renda, que tem acesso a emprego formal e mais seguro, consegue se aposentar por tempo de contribuição, muitas vezes com menos de 50 anos e receber uma aposentadoria de valor maior. Isso significa que o pobre vai receber aposentadoria menor e por menos tempo do que o mais rico. Quando a comparação é com servidores públicos, a disparidade é ainda maior, pois muitos servidores públicos ainda
têm direito a se aposentar com o último salário (integralidade).
Por isso, uma reforma que preserva os benefícios e as regras dos mais pobres, e torna mais exigentes as regras dos mais ricos, como está sendo proposto, definitivamente não é uma reforma que joga o custo nas costas dos pobres. Se a reforma não ocorrer, aí sim o custo será pago principalmente pelos mais pobres. Primeiro, porque a inflação subirá, e está provado que os pobres sofrem mais do que os ricos os efeitos da inflação. Segundo, porque a economia vai crescer mais devagar, gerando menos empregos. O desemprego também tem uma incidência e um custo mais concentrado nos mais pobres.
7) A reforma prejudica os pobres e não mexe com os mais ricos
A reforma faz justamente o contrário. Aposentadorias no valor de um salário mínimo: a reforma não mexe. Aposentadorias dos trabalhadores rurais: a reforma não mexe. Benefício de Prestação Continuada, para idosos e deficientes de baixa renda: a reforma não mexe.
Por outro lado, as aposentadorias do setor público, que podem superar os R$ 20 mil, vão passar a ficar limitadas ao teto das aposentadorias do setor privado, que é de R$ 5,5 mil.
Acaba a possibilidade de se aposentar muito cedo, às vezes abaixo dos 50 anos de idade. Essa aposentadoria precoce é possível hoje porque não existe idade mínima para se aposentar. Basta ter tempo de contribuição. Mas quem consegue somar 35 anos de contribuição são as pessoas de maior renda, que têm emprego fixo, em empresas formais. Os mais pobres, que ficam muito tempo no desemprego, só conseguem se aposentar por idade, aos 65 anos de idade. Com a reforma, ricos e pobres vão se aposentar com a mesma idade.
Também acaba o privilégio dos servidores mais antigos, que ainda têm direito a aposentadoria com salário integral e corrigida pelos mesmos reajustes do pessoal da ativa. Ainda é oferecida a opção para esses servidores de manterem esse privilégio, mas o servidor terá que se aposentar aos 65 anos, e a servidora aos 62. Se quiser se aposentar antes, terá aposentadoria integral, porém calculada pela média das contribuições.
8) Não se pode, de uma hora para outra, obrigar a pessoa a trabalhar até os 65 anos
A reforma não faz isso. No RGPS, a idade mínima começará em 53 anos para mulheres e 55 anos para os homens. A idade mínima vai subir 1 ano a cada dois anos, de modo que só chegaremos aos 62 anos para mulheres em 2036 e em 65 anos para homens em 2038. No RPPS, a idade mínima começará nos atuais já exigidos 55 anos para mulheres e 60 anos para homens. A idade mínima das mulheres atingirá 62 anos em 2032, e dos homens atingirá 65 anos em 2028.
9) Estão jogando os custos nas costas dos servidores mais antigos, que já sofreram os efeitos de reformas anteriores, já estão cumprindo regras de transição, e vão ser obrigados a se aposentar apenas com 62 anos, no caso das mulheres, e 65 anos, no caso dos homens
Reformas da previdência são sempre polêmicas, e sempre geram reações que acabam levando ao abrandamento de regras propostas. Foi isso o que aconteceu em reformas recentes que aconteceram no Brasil em 2003, 2005 e 2013. Um desses abrandamentos foi, justamente, visando manter o ultimo salario (integralidade) e reajustes iguais aos da ativa (paridade) para os servidores que já estavam a mais tempo no serviço público.
Ocorre que o problema da previdência se agrava e, com o passar do tempo, constata-se que as reformas anteriores não foram suficientes para resolver o problema, e novas reformas precisam ser feitas. Esse é o motivo pelo qual muitos trabalhadores, em especial servidores, acabam passando por mais de uma regra de transição. O fato de já estar em uma regra de transição não é suficiente para que se alegue: “eu já estou na transição, já paguei a minha parte”. Infelizmente, o que está acontecendo é que as regras (mitigadas) das outras reformas não foram suficientes para resolver o problema. E está sendo preciso mudar a regra novamente. Nada menos que 95% dos servidores que se aposentaram em 2016 tinham direito à integralidade e paridade. Isso tem um peso significativo na despesa.
Na proposta atual, no caso dos servidores públicos que ingressaram antes de 2003, eles não passam direto para a idade mínima de 62/65 anos. É necessário fazer a distinção de poder se aposentar e quanto irá receber. Eles poderão se aposentar antes, pela regra geral, que calcula a aposentadoria pela média das remunerações de contribuição. Porém, se preferirem o privilégio de manter o último salário (integralidade) com paridade de reajuste da aposentadoria com os reajustes concedidos aos colegas da ativa, serão necessários os 62/65 anos.
Nada mais justo que, em uma reforma, igualar as condições de todos, e reduzir privilégios e condições especiais que sobreviveram a reformas anteriores. E isto está sendo feito de forma gradual. Não é simplesmente extinta a possibilidade de se aposentar com o último salário, mas se cria uma condição em que, para obtê-la, será preciso contribuir mais.
As aposentadorias do RPPS, embora atinjam proporcionalmente poucas famílias do País, são responsáveis por cerca de 7% de toda a desigualdade de renda – principalmente por conta da integralidade e da paridade. Isso é um dos fatores que faz com que o sistema previdenciário no Brasil contenha injustiças sociais e contribua para a indesejada manutenção da desigualdade de renda ao longo do tempo.
10) A Previdência dos servidores públicos já está equilibrada, porque já passou por reformas anteriores
Errado: ainda vai demorar décadas para entrar em equilíbrio, com um déficit muito alto, que implicará menos recursos para as outras políticas públicas. Na União, o déficit foi de R$ 77 bilhões em 2016 e vai pular para R$ 83 bilhões em 2017. A situação dos Estados é ainda mais dramática. Em 2016, o déficit foi de R$ 90 bilhões, e em 2017 pulará para R$ 112 bilhões. Vários estados já não estão conseguindo pagar em dia as aposentadorias e pensões.
11) Não é preciso fazer reforma na Previdência dos servidores públicos. Essa reforma já foi feita em 2003, 2008 e 2013. Desde então a aposentadoria dos servidores já está limitada, não é mais integral
As reformas já feitas na legislação da previdência não foram suficientes para estancar o desequilíbrio financeiro. O sistema previdenciário de qualquer país precisa de ajustes contínuos ao longo do tempo: não existe reforma única que solucione todos os problemas. Da mesma forma como está ocorrendo agora, as reformas anteriores sofreram muitas restrições políticas. Reformar a previdência é sempre difícil, no Brasil e no resto do mundo. Por isso, muitas situações especiais e tratamentos privilegiados permaneceram intocados naquelas reformas, por emendas aprovadas durante a tramitação no Congresso.
Por causa dessas dificuldades, em vez de uma única reforma que resolva o desequilíbrio de uma vez por todas, os países acabam fazendo várias e consecutivas pequenas reformas. Por exemplo, a França reformou sua previdência em 2010 (aumento da idade mínima e exigência de idade mínima para aposentadoria integral) e em 2013 (aumento do tempo de contribuição mínimo). A Alemanha fez três reformas, em 1992 (igualou idade mínima para homens e mulheres), 2007 (aumentou gradualmente a idade mínima) e 2014 (aposentadoria aos 63 anos para os que contribuíram pelo menos 45 anos). A Grécia, por sua vez, tem se esforçado desde
2010 para reformar suas regras previdenciárias, tendo feito modificações adicionais em 2012 e em 2016, que contemplaram aumento da idade mínima com convergência para homens e mulheres e aumento do tempo de contribuição.
Ainda existe um grande número de servidores que entraram no serviço público antes de 2003, e que têm direito a se aposentar com ultimo salario (integralidade) e com paridade de remuneração com o pessoal da ativa. Nada menos que 95% dos servidores que se aposentaram em 2016 tinham direito a integralidade e paridade. Isso tem um peso significativo na despesa.
Também há outro grupo que entrou antes de 2013, e cujo valor da aposentadoria não está limitado ao teto do INSS. Além disso, a idade mínima, já existente para os servidores, está baixa frente aos padrões demográficos do Brasil. Essa idade mínima é hoje de 60 anos para homens e de 55 para mulheres, e precisa subir para 65 anos para homens e 62 anos para mulheres.
12) Não é verdade que a Previdência do servidor é privilegiada, porque ele contribui sobre o salário integral (enquanto no INSS a contribuição é sobre o teto das aposentadorias); o servidor não recebe FGTS quando se aposenta; o servidor já tem idade mínima (no RGPS não existe)
Sim, a contribuição do servidor é maior, porém o benefício é muito maior. O grande problema é que os benefícios não são proporcionais à contribuição: uma mesma contribuição no RPPS dá direito a um benefício muito maior do que no INSS.
Quanto à idade mínima que já existe para os servidores (60 anos para homens e 55 para mulheres), ela não apenas é baixa, como também tem uma regra de transição muito lenta, estabelecida em reforma anterior. Vai demorar décadas até que todos os servidores estejam submetidos a ela. Além disso, no setor público não existe fator previdenciário: uma mesma aposentadoria em uma idade jovem no RPPS gera um benefício muito maior do que no RGPS. No que diz respeito ao FGTS, ele é um fundo para amparar o trabalhador no momento em que é demitido. Com a estabilidade que existe para o servidor público, não faz sentido que ele tenha FGTS.
13) Os políticos reformam a Previdência dos outros, mas não mexem na Previdência deles
Com a reforma, novos detentores de mandato eletivo somente poderão se aposentar pelo Regime Geral. O Plano de Seguridade Social dos congressistas ou qualquer outro plano específico de detentores de mandato eletivo não receberá novos participantes. Entrarão em extinção. É fim de privilégios. É igualdade de regras para todos.
14) Por que não mexem com as aposentadorias dos juízes, procuradores e desembargadores?
Todos eles serão afetados pela reforma. As aposentadorias de juízes, procuradores e desembargadores seguem as mesmas regras das aposentadorias dos demais servidores públicos. E são eles os principais afetados pela reforma, justamente porque são os que atualmente têm os maiores privilégios. A reforma vem justamente para acabar com esses privilégios. Não é de se admirar que as entidades sindicais e de representação dos profissionais do judiciário e do ministério público estão entre os mais aguerridos adversários da reforma.
15) Se é para acabar com privilégios, por que não reformam a Previdência dos militares?
A reforma da previdência que está em discussão é uma Proposta de Emenda à Constituição. A Previdência dos militares não está na Constituição, e sim em lei específica. Se não for reformado o regime de todos os civis, não haverá justificativa nem suporte político para se reformar a previdência dos militares isoladamente.
Uma boa desculpa para quem não quer fazer reforma nenhuma é dizer que é preciso fazer tudo de uma vez só. Como isso se torna muito mais difícil, a paralisia acaba imperando, e nada acontece. Sempre é (e será) possível identificar alguma outra injustiça no mundo como fator condicionante para funcionar como desculpa para justificar posição contraria à reforma.
16) A reforma não mexe com a Previdência nos governos estaduais, onde está o maior desequilíbrio
Errado: pela reforma proposta, os estados terão 6 meses para aprovar regras distintas para seu regime próprio de previdência. Se não o fizerem, valerá para eles a reforma aprovada para o regime próprio dos servidores da União. Todos os governos estaduais têm interesse em reformar suas previdências, pois sabem do peso da conta, e não deverão propor regras distintas para seus servidores.
17) A reforma é para atender o sistema financeiro, que quer vender planos de aposentadoria privada
O sistema financeiro vai vender muito plano de aposentadoria privada se a reforma não passar, pois em pouco tempo vai ficar claro que não será possível pagar as aposentadorias do sistema público, como já está acontecendo em vários governos estaduais.
Vendo esta situação, os mais jovens logo vão perceber que não podem contar com a previdência pública no futuro. Vão preferir trabalhar com contrato informal, sem pagar contribuição à previdência, e contribuir para um plano privado, pois julgarão ser maior a probabilidade de receber a aposentadoria no futuro.
18) A reforma da Previdência é para tirar dinheiro do aposentado para pagar os juros da dívida pública
Quanto mais grave o déficit da previdência, mais dinheiro o governo tem que pegar emprestado e, portanto, mais juros ele tem que pagar. Por isso, a reforma da previdência é justamente para o governo pagar menos juros, e ter mais dinheiro disponível para financiar serviços de saúde, saneamento, educação e segurança pública.
19) A contribuição dos servidores é muito alta, se forem contabilizados os juros sobre essas contribuições, haveria saldo suficiente para pagar uma aposentadoria pelo salário integral
Isso não é verdade. Primeiro, porque, no Brasil, servidores da ativa contribuem para pagar a aposentadoria dos que já estão na inatividade. Por isso, a contribuição paga por cada servidor não fica em uma conta de poupança, rendendo juros.
Em segundo lugar, porque a população está vivendo cada vez mais. Por isso, o número de aposentados está crescendo em relação ao número de servidores na ativa. Cada vez há mais aposentadorias a pagar e menos contribuições a receber. Tal desafio não é somente no Brasil, outros países também passaram e passam por fenômeno semelhante. No entanto, no caso brasileiro, a urgência é maior porque nosso sistema possui muitas distorções e o envelhecimento é muito mais acelerado.
Em terceiro lugar, mesmo que a aposentadoria dos servidores fosse financiada por conta individual, que rendesse juros, a conta não fecharia. A expectativa de vida de uma pessoa na faixa de 60 a 64 anos é de 304 meses (cerca de 25 anos). Uma aposentadoria integral, após 35 anos de contribuição, de 11% para o servidor e 11% para a União, capitalizados por uma elevadíssima taxa real de 5,2% ao ano, e um modesto ganho real permitido pela regra da paridade de 1% ao ano, garantiria fundos para pagar 227 meses (menos de 19 anos) de aposentadoria. Ficariam faltando 77 meses (mais de 6 anos) de aposentadoria e mais alguns anos de pensão deixados para os dependentes. Além disso, existem outros benefícios de risco como auxílios e aposentadoria por invalidez que o indivíduo tem direito, caso seja necessário: a conta não fecha.
20) De acordo com um post que viralizou no whatsapp, um trabalhador que ganha R$ 880 por mês e contribui com 20% para a previdência ao longo de 35 anos, gera uma poupança que, remunerada pela taxa de juros da caderneta de poupança, seria suficiente para pagar a ele aposentadoria ao longo de 40 anos e 3 meses. O post mostra a conta passo a passo e conclui que a poupança acumulada pelo trabalhador ao final dos 35 anos será de R$ 422.784,02, mas que ele só receberá em aposentadoria o equivalente a R$ 158.400,00, morrendo antes de resgatar tudo o que contribuiu. E com isso o post conclui que não é possível haver déficit na previdência
Essa conta impressiona, por mostrar os valores com precisão de centavos. Mas está absolutamente errada, porque usa números irreais. Em primeiro lugar, um trabalhador que ganha R$ 880 por mês não tem contribuição de 20% ao mês, e sim 16% (8% para o empregado e 8% para o empregador). Em segundo lugar, a taxa de juros usada é muito alta, e equivale a mais de 8% ao ano acima da inflação, quando a média histórica no Brasil é de 5% ao ano. Em terceiro lugar, subestima a expectativa de vida que, aos 60 anos, não é de 75 anos, mas sim de 81 anos. Em quarto lugar, toma uma situação extrema em que o segurado contribui por 35 anos, não considerando que muitos chegam aos 65 anos tendo contribuído por muito menos tempo e já podem se aposentar por idade com apenas 15 anos de contribuição.
Se refizermos o exercício corrigindo as distorções acima, e supondo que o indivíduo contribua por 20 anos e se aposente por idade aos 65 anos, ele terá acumulado apenas R$ 64.905,34. Mesmo que continue incidindo juros sobre esse valor acumulado, durante a aposentadoria, esse saldo será suficiente para pagar sua aposentadoria mensal de R$ 880 por apenas 6,7 anos. Como ele terá 16 anos de sobrevida, ficarão faltando recursos para pagar 9,3 anos de aposentadoria. Além disso, não é considerada a possibilidade de geração de pensão por morte para seus dependentes originária de sua aposentadoria nem é considerado o amplo conjunto de benefícios permanentes e temporários da previdência, tais como: aposentadoria por invalidez (não-programada), auxílio doença, entre outros.
Essa conta fica ainda mais sem sentido quando constatamos que a contribuição do trabalhador não vai para uma conta que rende juros. Os trabalhadores de hoje pagam a aposentadoria dos aposentados de hoje. Como a população está envelhecendo, e o número de aposentados crescendo, cada vez há menos trabalhadores na ativa para cada aposentado. Para que a conta feche, a contribuição de cada trabalhador na ativa vai ter que crescer sempre. Em 2065 será necessária uma alíquota de contribuição de 120% do valor do salário para que se possa pagar todas as aposentadorias.
21) Não tem que fazer reforma nenhuma. Tem é que cobrar os bilhões de reais que grandes empresas devem à previdência. Não se pode jogar a conta no trabalhador e não cobrar nada dos grandes tubarões. Até empresas públicas devem grandes valores para a previdência
Quando o nome de uma empresa aparece na lista de devedores da previdência, isso não significa que ela se recusou a pagar e que o governo não está cobrando. Além das dívidas propriamente ditas, estão naquela lista empresas que entraram na justiça para contestar débitos. São cobranças e multas feitas pela Receita Federal com as quais a empresa não concorda e contesta judicialmente. Para fazer isso, a empresa deposita o valor em juízo. Nesses casos houve pagamento, e se está discutindo o valor devido. De um total de R$ 432,9 bilhões que constam da lista de devedores, R$ 52 bilhões em processo de pagamento pelos devedores, tendo sido parcelados ou já contando com garantias para o pagamento. Restam, portanto, R$ 380,9 bilhões a serem cobrados.Há outros casos de empresas que são devedoras porque faliram. No processo de falência, a lei determina uma ordem de pagamento dos credores. Em primeiro lugar vêm os trabalhadores. O fisco fica atrás na fila, e em muitos casos não sobra dinheiro para pagá-lo. A Procuradoria da Fazenda mantém esses créditos não recebidos na lista de dívidas com a previdência, mas as empresas não existem mais, e o valor dificilmente será recuperado. Por essas razões, R$ 220 bilhões ou 58% da dívida a ser cobrada é de baixa ou remota possibilidade de recuperação.
Excluindo-se os dois casos acima, restam as dívidas de empresas em atividade e que não contam com depósitos judiciais prévios, classificadas como de alta ou média possibilidade de recuperação, que somam R$ 160 bilhões. Esse valor ainda é alto, mas não está perdoado ou esquecido pelo governo. A Procuradoria da Fazenda Nacional trabalha justamente para processar os devedores e cobrar a dívida. Em média, por ano, são recuperados R$ 4 bilhões.
Não existe essa ideia de que grandes empresas não pagam, o governo não cobra, e fica por isso mesmo. Assim como ocorre com outros tributos, há um cotidiano de autuações, recursos, cobranças, contestações judiciais. Ainda assim, o prazo médio das ações de execução fiscal é de quase 10 anos. E custa dinheiro para cobrar esses valores. Cada ação custa cerca de R$ 5 mil e tem chance de recuperação de seu valor integral de apenas 26%.
Por fim, supondo que magicamente o governo conseguisse receber toda a dívida que as empresas têm com a previdência, isso não cobriria nem 3 anos de déficit. E depois não haveria mais dívida para cobrar, e o déficit dos anos seguintes voltaria a acontecer. Cobrar os devedores da previdência é importante e há um esforço para que isso gere o melhor resultado possível. Mas não é isso que vai resolver o problema.
22) Se o governo tem déficit e as contas da Previdência estão tão ruins, porque o mesmo governo faz parcelamento da dívida de tributos das empresas, dando perdão de multa e juros?
De fato, os parcelamentos são um problema. Não só porque o fisco abre mão de receber receitas de juros e multas mas, principalmente, porque estimula as empresas a não pagar em dia, esperando pela próxima rodada de perdão. As autoridades da Receita costumam ser contra parcelamentos de dívida tributária.
No entanto, estando em uma democracia, é preciso respeitar as decisões do Congresso. Assim como a reforma da previdência precisa ser aprovada no Congresso, os refinanciamentos de dívida tributária também são aprovados no Congresso. O Poder Executivo pode vetar os refinanciamentos, mas em geral o Congresso consegue reunir maioria para derrubar o veto aos refinanciamentos.
O fato concreto, todavia, é que uma eventual extinção de todos os parcelamentos de dívidas tributárias não resolveria o problema da previdência. Ele continuaria a existir e a ameaçar o governo de falência, de não ser capaz de pagar as aposentadorias devidas, de ter que interromper todos os demais programas públicos para dar conta da despesa da previdência.
Os refinanciamentos de dívida tributária aprovados pelo Congresso entre 2000 e maio de 2017, representaram perda anual média de R$ 18 bilhões. Isso não é suficiente para cobrir nem 10% do déficit do RGPS projetado para 2017.. A dimensão do problema previdenciário é muito maior.
23) Se está faltando dinheiro para pagar benefícios da Previdência, por que o governo tira dinheiro do orçamento da seguridade, usando a DRU (Desvinculação das Receitas da União)?
A DRU não tira receitas da previdência. A despesa da previdência é obrigatória: todo mundo que tem direito a uma aposentadoria, recebe. Todos os auxílios-doença, aposentadorias por invalidez e demais benefícios devidos são pagos. Se falta dinheiro no orçamento da seguridade para pagar esses benefícios, o governo tem que pagar. Nesse caso, mesmo que ele tenha autorização legal para gastar o dinheiro da seguridade em outro tipo de despesa, ele não o fará, porque não está sobrando dinheiro no orçamento da seguridade.
Portanto, mesmo que exista uma regra que diga que 30% do orçamento da seguridade social não precisa ser gasto obrigatoriamente na seguridade, o fato é que a despesa do orçamento da seguridade é maior que as suas receitas. Então a DRU se torna inócua.
Por exemplo, em 2016, a DRU significou dizer que R$ 91,7 bilhões bilhões não precisariam ser gastos com seguridade, poderiam ser gastos em outras despesas, como educação, segurança pública ou infraestrutura. Mas essa mudança de destinação não ocorreu. Na verdade, o governo precisou tirar dinheiro dessas outras funções para mandar mais R$ 258,6 bilhões para complementar as despesas da seguridade.
24) Existe muita renúncia de receita da Previdência. Se fosse aprovada uma lei acabando com todos os tratamentos especiais que existem para vários setores, que contribuem menos que os demais, o déficit da previdência estaria resolvido
De fato, as renúncias tributárias são elevadas. Em 2016, se não houvesse nenhuma renúncia de receita da Previdência, o déficit seria 41% menor, o que equivale a R$ 80 bilhões. Essa renúncia cresceu muito nos últimos anos, passando de R$ 14 bilhões em 2007 para R$ 66 bilhões em 2015.
O Governo Federal está trabalhando para reduzir essa renúncia. Em 2016 ela já caiu para R$ 58 bilhões, e há iniciativas para reduzir outros R$ 20 bilhões. A renúncia na exportação da produção rural (R$ 6 bilhões em 2016) é extinta pela reforma da previdência; e a desoneração da folha de pagamento de diversos setores (R$ 14,6 bilhões em 2016) tem sua extinção parcial proposta pelo PL 8.456/2017, em tramitação no Congresso.
Ainda que não se concorde com o mérito de uma desoneração, o fato concreto é que, uma vez concedida, ela afeta as decisões de investimento e contratação das empresas por ela beneficiada. Isso significa que, criar benefício tributário é fácil, removê-lo é difícil e tem que ser feito com cuidado, pois haverá impactos negativos sobre o emprego, formalidade e renda dos trabalhadores. Fazer uma brusca retirada de desonerações em momento de crise econômica aguda pode ser traumático e desorganizar os segmentos afetados.
O Simples Nacional, que atende pequenas e médias empresas, responde por mais de 50% dos benefícios. O subsídio dado ao Microempreendedor Individual custou foi criado para estimular a inclusão de trabalhadores autônomos de baixa renda no regime da Previdência (Lei 12.470/2011). Para os beneficiários, a alíquota de contribuição ao INSS é reduzida a 5% do salário mínimo. Assim, a redução ou extinção de ambas as renúncias é o mesmo que aumentar impostos pagos por micro e pequenas empresas e MEI.
Mas é importante ressaltar que, com o passar do tempo, as renúncias de receitas, em seus montantes atuais, perdem relevância. A despesa vai crescer tão rápido, em função do envelhecimento da população, que a participação das renúncias no déficit total tende a encolher.
Ou seja, reduzir as renúncias é importante, a reforma da previdência propõe isso. Mas só isso seria insuficiente e irrelevante para a solução do problema no médio e longo prazo. As demais renúncias de receita poderão ser aperfeiçoadas por meio de projetos de lei. Contudo, as mudanças nas renúncias não substituem a necessidade da reforma. Para garantirmos uma Previdência Social sustentável, as regras do sistema precisam mudar.
25) O déficit só apareceu por causa da recessão, basta a economia voltar a crescer que a Previdência se reequilibra
O desequilíbrio da previdência é estrutural: a despesa cresceu muito mais que a receita mesmo nos anos de maior crescimento econômico e só vai piorar ao longo do tempo com o envelhecimento da população. A retomada do crescimento pode melhorar a arrecadação da previdência, mas não vai impedir a tendência demográfica do envelhecimento e o consequente aumento da despesa com aposentadorias.
O Brasil já gasta com previdência 13% do PIB e só tem 13% de idosos na sua população. O Japão, por exemplo, gasta os mesmos 13% do PIB, mas sua população de idosos equivale a 48% da população total. O Brasil está envelhecendo muito rápido: em 2050, um em cada três brasileiros serão idosos. Mantida a taxa atual, o envelhecimento da população brasileira será mais de duas vezes mais rápido que a média mundial.
Embora o InfoMoney não tenha conseguido identificar quem é o autor desta obra, a qualidade do texto nos deixou bem confortável em compartilhá-lo com vocês, leitores e leitoras. Aos que entendem a importância da reforma, vale a pena a leitura e o compartilhamento com aqueles que pensam diferente; já aos que são contra mudar as regras da previdência, é uma oportunidade para mudar de ideia – ou pelo menos entender que quem pensa a favor da reforma não é necessariamente um “golpista”.
Confira a íntegra do documento:
1) Não existe déficit da Previdência
Essa tese é defendida por um sindicato que representa servidores de elite. A maioria se aposentando pelo salário máximo do funcionalismo (R$ 33 mil). É óbvio que esse grupo de interesse tem muito a perder com a reforma da Previdência. Em quem você acreditaria mais: nesse sindicato, ou em uma instituição pública cuja função é auditar as contas do governo, como o TCU (Tribunal de Contas da União)? Será que os auditores do TCU iriam mentir para enganar o povo? Pois bem, auditoria do TCU já mostrou que o déficit da previdência em 2016 foi de R$ 226,9 bilhões, e o déficit da Seguridade Social foi de R$ 264,9 bilhões.
Mesmo pela metodologia usada por quem diz que não há déficit, o resultado para 2016 é um déficit de R$ 57 bilhões e em 2017 será de mais de R$ 100 bilhões. Repare que quem apresenta as contas do “não existe déficit” sempre traz um histórico até o ano de 2015. Por que, se são públicos os números de 2016? Pois, se seguir adiante, vai mostrar números negativos.
Uma CPI do Senado, na qual atuaram apenas parlamentares da oposição, também disse que o déficit não existe. Mas o relatório dessa CPI não mostra em nenhuma das suas centenas de páginas qual o valor do suposto superávit, nem em 2016, nem em 2017, nem nos próximos anos. Ela apenas afirma haver superávit, mas não diz de quanto seria, nem qual seria a metodologia de cálculo. Nenhum dos participantes das audiências públicas feitas pela CPI mostrou este dado. Trata-se de simples manifestação política que visa poluir a discussão, sem qualquer fundamento técnico.
2) As pessoas vão trabalhar até morrer
Quem defende essa tese diz que a idade mínima de aposentadoria não pode ser de 65 anos, pois existem estados brasileiros em que a expectativa de vida é apenas um pouco maior do que isso. Em Alagoas e no Maranhão, por exemplo, é de 66 anos. Em média, as pessoas só ficariam aposentadas 1 ano.
Essa interpretação não faz sentido. O dado refere-se a expectativa de vida de uma criança ao nascer, faz com que a expectativa de vida em regiões pobres seja reduzida, infelizmente, pela alta mortalidade infantil e de jovens pobres em decorrência da violência. Aqueles que sobrevivem a esses episódios, e chegam à velhice, se tornando aptos a receber uma aposentadoria, têm expectativa de viver muitos anos a partir daquele momento. É esse o dado relevante para medir a sustentabilidade da previdência. Quantos anos uma pessoa de 60 anos ainda vai viver e receber sua aposentadoria? A isso se chama expectativa de sobrevida e essa é elevada tanto nas regiões ricas quanto nas pobres. No Nordeste, uma pessoa de 60 anos tem expectativa de viver até os 81 anos. No Sudeste, até os 83 anos.
3) Vai ser preciso trabalhar 40 anos para se aposentar
Errado: uma coisa é poder se aposentar, outra é quanto vai receber de aposentadoria. O trabalhador do setor privado poderá se aposentar quando tiver 15 anos de contribuição e atingir a idade mínima. A idade mínima logo depois da reforma será de 53 para mulheres e de 55 para homens. Essa idade mínima subirá gradativamente até atingir 62 anos para mulheres em 2036 e 65 anos para homens em 2038. No caso do servidor público, o tempo mínimo de contribuição é de 25 anos e a idade mínima parte dos atuais 55 anos para mulheres e 60 anos para homens, atingindo 62 anos para as mulheres em 2032 e 65 anos para homens em 2028.
Já o tempo de contribuição acima dos 15 anos para se aposentar definirá o quanto o aposentado irá receber. Os 40 anos de trabalho referem-se ao tempo necessário para receber aposentadoria equivalente a 100% do salário de contribuição (aposentadoria integral). A pessoa que se aposentar com o tempo mínimo de contribuição pelo RGPS (15 anos) receberá 60% do salário de contribuição. Quanto mais tempo ela demorar para se aposentar, maior será o valor da aposentadoria a receber. É uma regra justa: quem passa mais tempo contribuindo recebe aposentadoria maior. Com 40 anos de contribuição, seu valor atinge 100% do salário
médio de contribuição.
É preciso separar o direito de poder se aposentar do quanto se vai receber (valor da aposentadoria). Para poder se aposentar, são necessários somente 15 anos de contribuição (25 no serviço público) e atingir a idade mínima, e não 40 anos de contribuição. Com relação ao quanto se vai receber (valor da aposentadoria), na grande maioria dos países esse valor é muito menor que o do salário da ativa. A taxa de 60%, garantida para o
trabalhador que tem o tempo mínimo de contribuição e a idade mínima, já é elevada para os padrões internacionais.
Vale lembrar ainda um detalhe importante: quem recebe salário mínimo poderá se aposentar após 15 anos de contribuição, e atingimento da idade mínima, recebendo 100% da remuneração da ativa, pois o salário mínimo é o piso do benefício da previdência. Nada menos que 60% das aposentadorias pagas pelo INSS são de um salário mínimo. E elas não terão seu valor afetado pela reforma.
4) A reforma vai diminuir o valor da aposentadoria de todos os trabalhadores
Errado. Em primeiro lugar, nada muda para quem já está aposentado ou já tem direito de se aposentar. Em segundo lugar, para dois terços dos brasileiros que ainda não se aposentaram, não haverá qualquer mudança no valor da aposentadoria. Eles se aposentarão recebendo aposentadoria pelo salário mínimo (aposentadoria integral com apenas 15 anos de contribuição) porque o menor benefício da previdência é o salário mínimo. Para os demais trabalhadores, na verdade, a reforma pode até aumentar o valor do benefício, uma vez que ela acaba com o fator previdenciário.
5) A reforma da Previdência acaba com direitos sociais. Não se pode aceitar isso: nenhum direito a menos!
Quem já está aposentado ou já tem direito à aposentadoria não é afetado pela reforma. Ela não mexe em direito adquirido. Não há nenhuma retirada de direitos. Quem ainda não adquiriu esse direito, vai ter mudanças de regras proporcionalmente ao tempo que falta para se aposentar.
É preciso lembrar que o direito de um é obrigação de outros. É a sociedade que paga a conta. Não existe uma disputa entre população de um lado, querendo garantir direitos, e governo de outro, querendo cortar direitos. O governo não fabrica dinheiro. Ele paga aposentadorias e outras despesas com o dinheiro que arrecada da população, cobrando impostos.
Se a previdência não for reformada, a conta a ser paga pela sociedade vai ficar muito alta. Ter que pagar impostos elevadíssimos não seria uma perda de direito? Não seria uma perda do direito de dispor do próprio dinheiro, de ter emprego, de ter serviços de saúde e segurança providos pelo governo?
6) Estão jogando o custo do ajuste nas costas dos pobres
Errado: 75% dos atuais trabalhadores em atividade não serão afetados pela reforma. Ela está direcionada para remover ou diminuir as condições especiais e privilegiadas de aposentadoria que ainda existem hoje, principalmente para os mais ricos.
Um dos méritos da reforma da previdência é justamente o fato de ser um ajuste que pesa menos para os mais pobres. De acordo com recente estudo do Banco Mundial, quando se considera o que cada indivíduo contribui para Previdência e o que ele recebe da Previdência, o benefício líquido se concentra nos mais ricos, ou seja, os mais ricos são aqueles que acabam por receber benefícios muito superiores a sua contribuição. Os 20% mais pobres ficam apenas com 4% dos subsídios da Previdência (diferença entre o que contribuem e o que recebem), enquanto os 20% mais ricos ficam com 35%.
Não é difícil entender o porquê. Um trabalhador que ganha um salário mínimo e passa por vários períodos de desemprego ao longo da vida, só vai conseguir se aposentar aos 65 anos e deve receber o salário mínimo. Já um trabalhador de alta renda, que tem acesso a emprego formal e mais seguro, consegue se aposentar por tempo de contribuição, muitas vezes com menos de 50 anos e receber uma aposentadoria de valor maior. Isso significa que o pobre vai receber aposentadoria menor e por menos tempo do que o mais rico. Quando a comparação é com servidores públicos, a disparidade é ainda maior, pois muitos servidores públicos ainda
têm direito a se aposentar com o último salário (integralidade).
Por isso, uma reforma que preserva os benefícios e as regras dos mais pobres, e torna mais exigentes as regras dos mais ricos, como está sendo proposto, definitivamente não é uma reforma que joga o custo nas costas dos pobres. Se a reforma não ocorrer, aí sim o custo será pago principalmente pelos mais pobres. Primeiro, porque a inflação subirá, e está provado que os pobres sofrem mais do que os ricos os efeitos da inflação. Segundo, porque a economia vai crescer mais devagar, gerando menos empregos. O desemprego também tem uma incidência e um custo mais concentrado nos mais pobres.
7) A reforma prejudica os pobres e não mexe com os mais ricos
A reforma faz justamente o contrário. Aposentadorias no valor de um salário mínimo: a reforma não mexe. Aposentadorias dos trabalhadores rurais: a reforma não mexe. Benefício de Prestação Continuada, para idosos e deficientes de baixa renda: a reforma não mexe.
Por outro lado, as aposentadorias do setor público, que podem superar os R$ 20 mil, vão passar a ficar limitadas ao teto das aposentadorias do setor privado, que é de R$ 5,5 mil.
Acaba a possibilidade de se aposentar muito cedo, às vezes abaixo dos 50 anos de idade. Essa aposentadoria precoce é possível hoje porque não existe idade mínima para se aposentar. Basta ter tempo de contribuição. Mas quem consegue somar 35 anos de contribuição são as pessoas de maior renda, que têm emprego fixo, em empresas formais. Os mais pobres, que ficam muito tempo no desemprego, só conseguem se aposentar por idade, aos 65 anos de idade. Com a reforma, ricos e pobres vão se aposentar com a mesma idade.
Também acaba o privilégio dos servidores mais antigos, que ainda têm direito a aposentadoria com salário integral e corrigida pelos mesmos reajustes do pessoal da ativa. Ainda é oferecida a opção para esses servidores de manterem esse privilégio, mas o servidor terá que se aposentar aos 65 anos, e a servidora aos 62. Se quiser se aposentar antes, terá aposentadoria integral, porém calculada pela média das contribuições.
8) Não se pode, de uma hora para outra, obrigar a pessoa a trabalhar até os 65 anos
A reforma não faz isso. No RGPS, a idade mínima começará em 53 anos para mulheres e 55 anos para os homens. A idade mínima vai subir 1 ano a cada dois anos, de modo que só chegaremos aos 62 anos para mulheres em 2036 e em 65 anos para homens em 2038. No RPPS, a idade mínima começará nos atuais já exigidos 55 anos para mulheres e 60 anos para homens. A idade mínima das mulheres atingirá 62 anos em 2032, e dos homens atingirá 65 anos em 2028.
9) Estão jogando os custos nas costas dos servidores mais antigos, que já sofreram os efeitos de reformas anteriores, já estão cumprindo regras de transição, e vão ser obrigados a se aposentar apenas com 62 anos, no caso das mulheres, e 65 anos, no caso dos homens
Reformas da previdência são sempre polêmicas, e sempre geram reações que acabam levando ao abrandamento de regras propostas. Foi isso o que aconteceu em reformas recentes que aconteceram no Brasil em 2003, 2005 e 2013. Um desses abrandamentos foi, justamente, visando manter o ultimo salario (integralidade) e reajustes iguais aos da ativa (paridade) para os servidores que já estavam a mais tempo no serviço público.
Ocorre que o problema da previdência se agrava e, com o passar do tempo, constata-se que as reformas anteriores não foram suficientes para resolver o problema, e novas reformas precisam ser feitas. Esse é o motivo pelo qual muitos trabalhadores, em especial servidores, acabam passando por mais de uma regra de transição. O fato de já estar em uma regra de transição não é suficiente para que se alegue: “eu já estou na transição, já paguei a minha parte”. Infelizmente, o que está acontecendo é que as regras (mitigadas) das outras reformas não foram suficientes para resolver o problema. E está sendo preciso mudar a regra novamente. Nada menos que 95% dos servidores que se aposentaram em 2016 tinham direito à integralidade e paridade. Isso tem um peso significativo na despesa.
Na proposta atual, no caso dos servidores públicos que ingressaram antes de 2003, eles não passam direto para a idade mínima de 62/65 anos. É necessário fazer a distinção de poder se aposentar e quanto irá receber. Eles poderão se aposentar antes, pela regra geral, que calcula a aposentadoria pela média das remunerações de contribuição. Porém, se preferirem o privilégio de manter o último salário (integralidade) com paridade de reajuste da aposentadoria com os reajustes concedidos aos colegas da ativa, serão necessários os 62/65 anos.
Nada mais justo que, em uma reforma, igualar as condições de todos, e reduzir privilégios e condições especiais que sobreviveram a reformas anteriores. E isto está sendo feito de forma gradual. Não é simplesmente extinta a possibilidade de se aposentar com o último salário, mas se cria uma condição em que, para obtê-la, será preciso contribuir mais.
As aposentadorias do RPPS, embora atinjam proporcionalmente poucas famílias do País, são responsáveis por cerca de 7% de toda a desigualdade de renda – principalmente por conta da integralidade e da paridade. Isso é um dos fatores que faz com que o sistema previdenciário no Brasil contenha injustiças sociais e contribua para a indesejada manutenção da desigualdade de renda ao longo do tempo.
10) A Previdência dos servidores públicos já está equilibrada, porque já passou por reformas anteriores
Errado: ainda vai demorar décadas para entrar em equilíbrio, com um déficit muito alto, que implicará menos recursos para as outras políticas públicas. Na União, o déficit foi de R$ 77 bilhões em 2016 e vai pular para R$ 83 bilhões em 2017. A situação dos Estados é ainda mais dramática. Em 2016, o déficit foi de R$ 90 bilhões, e em 2017 pulará para R$ 112 bilhões. Vários estados já não estão conseguindo pagar em dia as aposentadorias e pensões.
11) Não é preciso fazer reforma na Previdência dos servidores públicos. Essa reforma já foi feita em 2003, 2008 e 2013. Desde então a aposentadoria dos servidores já está limitada, não é mais integral
As reformas já feitas na legislação da previdência não foram suficientes para estancar o desequilíbrio financeiro. O sistema previdenciário de qualquer país precisa de ajustes contínuos ao longo do tempo: não existe reforma única que solucione todos os problemas. Da mesma forma como está ocorrendo agora, as reformas anteriores sofreram muitas restrições políticas. Reformar a previdência é sempre difícil, no Brasil e no resto do mundo. Por isso, muitas situações especiais e tratamentos privilegiados permaneceram intocados naquelas reformas, por emendas aprovadas durante a tramitação no Congresso.
Por causa dessas dificuldades, em vez de uma única reforma que resolva o desequilíbrio de uma vez por todas, os países acabam fazendo várias e consecutivas pequenas reformas. Por exemplo, a França reformou sua previdência em 2010 (aumento da idade mínima e exigência de idade mínima para aposentadoria integral) e em 2013 (aumento do tempo de contribuição mínimo). A Alemanha fez três reformas, em 1992 (igualou idade mínima para homens e mulheres), 2007 (aumentou gradualmente a idade mínima) e 2014 (aposentadoria aos 63 anos para os que contribuíram pelo menos 45 anos). A Grécia, por sua vez, tem se esforçado desde
2010 para reformar suas regras previdenciárias, tendo feito modificações adicionais em 2012 e em 2016, que contemplaram aumento da idade mínima com convergência para homens e mulheres e aumento do tempo de contribuição.
Ainda existe um grande número de servidores que entraram no serviço público antes de 2003, e que têm direito a se aposentar com ultimo salario (integralidade) e com paridade de remuneração com o pessoal da ativa. Nada menos que 95% dos servidores que se aposentaram em 2016 tinham direito a integralidade e paridade. Isso tem um peso significativo na despesa.
Também há outro grupo que entrou antes de 2013, e cujo valor da aposentadoria não está limitado ao teto do INSS. Além disso, a idade mínima, já existente para os servidores, está baixa frente aos padrões demográficos do Brasil. Essa idade mínima é hoje de 60 anos para homens e de 55 para mulheres, e precisa subir para 65 anos para homens e 62 anos para mulheres.
12) Não é verdade que a Previdência do servidor é privilegiada, porque ele contribui sobre o salário integral (enquanto no INSS a contribuição é sobre o teto das aposentadorias); o servidor não recebe FGTS quando se aposenta; o servidor já tem idade mínima (no RGPS não existe)
Sim, a contribuição do servidor é maior, porém o benefício é muito maior. O grande problema é que os benefícios não são proporcionais à contribuição: uma mesma contribuição no RPPS dá direito a um benefício muito maior do que no INSS.
Quanto à idade mínima que já existe para os servidores (60 anos para homens e 55 para mulheres), ela não apenas é baixa, como também tem uma regra de transição muito lenta, estabelecida em reforma anterior. Vai demorar décadas até que todos os servidores estejam submetidos a ela. Além disso, no setor público não existe fator previdenciário: uma mesma aposentadoria em uma idade jovem no RPPS gera um benefício muito maior do que no RGPS. No que diz respeito ao FGTS, ele é um fundo para amparar o trabalhador no momento em que é demitido. Com a estabilidade que existe para o servidor público, não faz sentido que ele tenha FGTS.
13) Os políticos reformam a Previdência dos outros, mas não mexem na Previdência deles
Com a reforma, novos detentores de mandato eletivo somente poderão se aposentar pelo Regime Geral. O Plano de Seguridade Social dos congressistas ou qualquer outro plano específico de detentores de mandato eletivo não receberá novos participantes. Entrarão em extinção. É fim de privilégios. É igualdade de regras para todos.
14) Por que não mexem com as aposentadorias dos juízes, procuradores e desembargadores?
Todos eles serão afetados pela reforma. As aposentadorias de juízes, procuradores e desembargadores seguem as mesmas regras das aposentadorias dos demais servidores públicos. E são eles os principais afetados pela reforma, justamente porque são os que atualmente têm os maiores privilégios. A reforma vem justamente para acabar com esses privilégios. Não é de se admirar que as entidades sindicais e de representação dos profissionais do judiciário e do ministério público estão entre os mais aguerridos adversários da reforma.
15) Se é para acabar com privilégios, por que não reformam a Previdência dos militares?
A reforma da previdência que está em discussão é uma Proposta de Emenda à Constituição. A Previdência dos militares não está na Constituição, e sim em lei específica. Se não for reformado o regime de todos os civis, não haverá justificativa nem suporte político para se reformar a previdência dos militares isoladamente.
Uma boa desculpa para quem não quer fazer reforma nenhuma é dizer que é preciso fazer tudo de uma vez só. Como isso se torna muito mais difícil, a paralisia acaba imperando, e nada acontece. Sempre é (e será) possível identificar alguma outra injustiça no mundo como fator condicionante para funcionar como desculpa para justificar posição contraria à reforma.
16) A reforma não mexe com a Previdência nos governos estaduais, onde está o maior desequilíbrio
Errado: pela reforma proposta, os estados terão 6 meses para aprovar regras distintas para seu regime próprio de previdência. Se não o fizerem, valerá para eles a reforma aprovada para o regime próprio dos servidores da União. Todos os governos estaduais têm interesse em reformar suas previdências, pois sabem do peso da conta, e não deverão propor regras distintas para seus servidores.
17) A reforma é para atender o sistema financeiro, que quer vender planos de aposentadoria privada
O sistema financeiro vai vender muito plano de aposentadoria privada se a reforma não passar, pois em pouco tempo vai ficar claro que não será possível pagar as aposentadorias do sistema público, como já está acontecendo em vários governos estaduais.
Vendo esta situação, os mais jovens logo vão perceber que não podem contar com a previdência pública no futuro. Vão preferir trabalhar com contrato informal, sem pagar contribuição à previdência, e contribuir para um plano privado, pois julgarão ser maior a probabilidade de receber a aposentadoria no futuro.
18) A reforma da Previdência é para tirar dinheiro do aposentado para pagar os juros da dívida pública
Quanto mais grave o déficit da previdência, mais dinheiro o governo tem que pegar emprestado e, portanto, mais juros ele tem que pagar. Por isso, a reforma da previdência é justamente para o governo pagar menos juros, e ter mais dinheiro disponível para financiar serviços de saúde, saneamento, educação e segurança pública.
19) A contribuição dos servidores é muito alta, se forem contabilizados os juros sobre essas contribuições, haveria saldo suficiente para pagar uma aposentadoria pelo salário integral
Isso não é verdade. Primeiro, porque, no Brasil, servidores da ativa contribuem para pagar a aposentadoria dos que já estão na inatividade. Por isso, a contribuição paga por cada servidor não fica em uma conta de poupança, rendendo juros.
Em segundo lugar, porque a população está vivendo cada vez mais. Por isso, o número de aposentados está crescendo em relação ao número de servidores na ativa. Cada vez há mais aposentadorias a pagar e menos contribuições a receber. Tal desafio não é somente no Brasil, outros países também passaram e passam por fenômeno semelhante. No entanto, no caso brasileiro, a urgência é maior porque nosso sistema possui muitas distorções e o envelhecimento é muito mais acelerado.
Em terceiro lugar, mesmo que a aposentadoria dos servidores fosse financiada por conta individual, que rendesse juros, a conta não fecharia. A expectativa de vida de uma pessoa na faixa de 60 a 64 anos é de 304 meses (cerca de 25 anos). Uma aposentadoria integral, após 35 anos de contribuição, de 11% para o servidor e 11% para a União, capitalizados por uma elevadíssima taxa real de 5,2% ao ano, e um modesto ganho real permitido pela regra da paridade de 1% ao ano, garantiria fundos para pagar 227 meses (menos de 19 anos) de aposentadoria. Ficariam faltando 77 meses (mais de 6 anos) de aposentadoria e mais alguns anos de pensão deixados para os dependentes. Além disso, existem outros benefícios de risco como auxílios e aposentadoria por invalidez que o indivíduo tem direito, caso seja necessário: a conta não fecha.
20) De acordo com um post que viralizou no whatsapp, um trabalhador que ganha R$ 880 por mês e contribui com 20% para a previdência ao longo de 35 anos, gera uma poupança que, remunerada pela taxa de juros da caderneta de poupança, seria suficiente para pagar a ele aposentadoria ao longo de 40 anos e 3 meses. O post mostra a conta passo a passo e conclui que a poupança acumulada pelo trabalhador ao final dos 35 anos será de R$ 422.784,02, mas que ele só receberá em aposentadoria o equivalente a R$ 158.400,00, morrendo antes de resgatar tudo o que contribuiu. E com isso o post conclui que não é possível haver déficit na previdência
Essa conta impressiona, por mostrar os valores com precisão de centavos. Mas está absolutamente errada, porque usa números irreais. Em primeiro lugar, um trabalhador que ganha R$ 880 por mês não tem contribuição de 20% ao mês, e sim 16% (8% para o empregado e 8% para o empregador). Em segundo lugar, a taxa de juros usada é muito alta, e equivale a mais de 8% ao ano acima da inflação, quando a média histórica no Brasil é de 5% ao ano. Em terceiro lugar, subestima a expectativa de vida que, aos 60 anos, não é de 75 anos, mas sim de 81 anos. Em quarto lugar, toma uma situação extrema em que o segurado contribui por 35 anos, não considerando que muitos chegam aos 65 anos tendo contribuído por muito menos tempo e já podem se aposentar por idade com apenas 15 anos de contribuição.
Se refizermos o exercício corrigindo as distorções acima, e supondo que o indivíduo contribua por 20 anos e se aposente por idade aos 65 anos, ele terá acumulado apenas R$ 64.905,34. Mesmo que continue incidindo juros sobre esse valor acumulado, durante a aposentadoria, esse saldo será suficiente para pagar sua aposentadoria mensal de R$ 880 por apenas 6,7 anos. Como ele terá 16 anos de sobrevida, ficarão faltando recursos para pagar 9,3 anos de aposentadoria. Além disso, não é considerada a possibilidade de geração de pensão por morte para seus dependentes originária de sua aposentadoria nem é considerado o amplo conjunto de benefícios permanentes e temporários da previdência, tais como: aposentadoria por invalidez (não-programada), auxílio doença, entre outros.
Essa conta fica ainda mais sem sentido quando constatamos que a contribuição do trabalhador não vai para uma conta que rende juros. Os trabalhadores de hoje pagam a aposentadoria dos aposentados de hoje. Como a população está envelhecendo, e o número de aposentados crescendo, cada vez há menos trabalhadores na ativa para cada aposentado. Para que a conta feche, a contribuição de cada trabalhador na ativa vai ter que crescer sempre. Em 2065 será necessária uma alíquota de contribuição de 120% do valor do salário para que se possa pagar todas as aposentadorias.
21) Não tem que fazer reforma nenhuma. Tem é que cobrar os bilhões de reais que grandes empresas devem à previdência. Não se pode jogar a conta no trabalhador e não cobrar nada dos grandes tubarões. Até empresas públicas devem grandes valores para a previdência
Quando o nome de uma empresa aparece na lista de devedores da previdência, isso não significa que ela se recusou a pagar e que o governo não está cobrando. Além das dívidas propriamente ditas, estão naquela lista empresas que entraram na justiça para contestar débitos. São cobranças e multas feitas pela Receita Federal com as quais a empresa não concorda e contesta judicialmente. Para fazer isso, a empresa deposita o valor em juízo. Nesses casos houve pagamento, e se está discutindo o valor devido. De um total de R$ 432,9 bilhões que constam da lista de devedores, R$ 52 bilhões em processo de pagamento pelos devedores, tendo sido parcelados ou já contando com garantias para o pagamento. Restam, portanto, R$ 380,9 bilhões a serem cobrados.Há outros casos de empresas que são devedoras porque faliram. No processo de falência, a lei determina uma ordem de pagamento dos credores. Em primeiro lugar vêm os trabalhadores. O fisco fica atrás na fila, e em muitos casos não sobra dinheiro para pagá-lo. A Procuradoria da Fazenda mantém esses créditos não recebidos na lista de dívidas com a previdência, mas as empresas não existem mais, e o valor dificilmente será recuperado. Por essas razões, R$ 220 bilhões ou 58% da dívida a ser cobrada é de baixa ou remota possibilidade de recuperação.
Excluindo-se os dois casos acima, restam as dívidas de empresas em atividade e que não contam com depósitos judiciais prévios, classificadas como de alta ou média possibilidade de recuperação, que somam R$ 160 bilhões. Esse valor ainda é alto, mas não está perdoado ou esquecido pelo governo. A Procuradoria da Fazenda Nacional trabalha justamente para processar os devedores e cobrar a dívida. Em média, por ano, são recuperados R$ 4 bilhões.
Não existe essa ideia de que grandes empresas não pagam, o governo não cobra, e fica por isso mesmo. Assim como ocorre com outros tributos, há um cotidiano de autuações, recursos, cobranças, contestações judiciais. Ainda assim, o prazo médio das ações de execução fiscal é de quase 10 anos. E custa dinheiro para cobrar esses valores. Cada ação custa cerca de R$ 5 mil e tem chance de recuperação de seu valor integral de apenas 26%.
Por fim, supondo que magicamente o governo conseguisse receber toda a dívida que as empresas têm com a previdência, isso não cobriria nem 3 anos de déficit. E depois não haveria mais dívida para cobrar, e o déficit dos anos seguintes voltaria a acontecer. Cobrar os devedores da previdência é importante e há um esforço para que isso gere o melhor resultado possível. Mas não é isso que vai resolver o problema.
22) Se o governo tem déficit e as contas da Previdência estão tão ruins, porque o mesmo governo faz parcelamento da dívida de tributos das empresas, dando perdão de multa e juros?
De fato, os parcelamentos são um problema. Não só porque o fisco abre mão de receber receitas de juros e multas mas, principalmente, porque estimula as empresas a não pagar em dia, esperando pela próxima rodada de perdão. As autoridades da Receita costumam ser contra parcelamentos de dívida tributária.
No entanto, estando em uma democracia, é preciso respeitar as decisões do Congresso. Assim como a reforma da previdência precisa ser aprovada no Congresso, os refinanciamentos de dívida tributária também são aprovados no Congresso. O Poder Executivo pode vetar os refinanciamentos, mas em geral o Congresso consegue reunir maioria para derrubar o veto aos refinanciamentos.
O fato concreto, todavia, é que uma eventual extinção de todos os parcelamentos de dívidas tributárias não resolveria o problema da previdência. Ele continuaria a existir e a ameaçar o governo de falência, de não ser capaz de pagar as aposentadorias devidas, de ter que interromper todos os demais programas públicos para dar conta da despesa da previdência.
Os refinanciamentos de dívida tributária aprovados pelo Congresso entre 2000 e maio de 2017, representaram perda anual média de R$ 18 bilhões. Isso não é suficiente para cobrir nem 10% do déficit do RGPS projetado para 2017.. A dimensão do problema previdenciário é muito maior.
23) Se está faltando dinheiro para pagar benefícios da Previdência, por que o governo tira dinheiro do orçamento da seguridade, usando a DRU (Desvinculação das Receitas da União)?
A DRU não tira receitas da previdência. A despesa da previdência é obrigatória: todo mundo que tem direito a uma aposentadoria, recebe. Todos os auxílios-doença, aposentadorias por invalidez e demais benefícios devidos são pagos. Se falta dinheiro no orçamento da seguridade para pagar esses benefícios, o governo tem que pagar. Nesse caso, mesmo que ele tenha autorização legal para gastar o dinheiro da seguridade em outro tipo de despesa, ele não o fará, porque não está sobrando dinheiro no orçamento da seguridade.
Portanto, mesmo que exista uma regra que diga que 30% do orçamento da seguridade social não precisa ser gasto obrigatoriamente na seguridade, o fato é que a despesa do orçamento da seguridade é maior que as suas receitas. Então a DRU se torna inócua.
Por exemplo, em 2016, a DRU significou dizer que R$ 91,7 bilhões bilhões não precisariam ser gastos com seguridade, poderiam ser gastos em outras despesas, como educação, segurança pública ou infraestrutura. Mas essa mudança de destinação não ocorreu. Na verdade, o governo precisou tirar dinheiro dessas outras funções para mandar mais R$ 258,6 bilhões para complementar as despesas da seguridade.
24) Existe muita renúncia de receita da Previdência. Se fosse aprovada uma lei acabando com todos os tratamentos especiais que existem para vários setores, que contribuem menos que os demais, o déficit da previdência estaria resolvido
De fato, as renúncias tributárias são elevadas. Em 2016, se não houvesse nenhuma renúncia de receita da Previdência, o déficit seria 41% menor, o que equivale a R$ 80 bilhões. Essa renúncia cresceu muito nos últimos anos, passando de R$ 14 bilhões em 2007 para R$ 66 bilhões em 2015.
O Governo Federal está trabalhando para reduzir essa renúncia. Em 2016 ela já caiu para R$ 58 bilhões, e há iniciativas para reduzir outros R$ 20 bilhões. A renúncia na exportação da produção rural (R$ 6 bilhões em 2016) é extinta pela reforma da previdência; e a desoneração da folha de pagamento de diversos setores (R$ 14,6 bilhões em 2016) tem sua extinção parcial proposta pelo PL 8.456/2017, em tramitação no Congresso.
Ainda que não se concorde com o mérito de uma desoneração, o fato concreto é que, uma vez concedida, ela afeta as decisões de investimento e contratação das empresas por ela beneficiada. Isso significa que, criar benefício tributário é fácil, removê-lo é difícil e tem que ser feito com cuidado, pois haverá impactos negativos sobre o emprego, formalidade e renda dos trabalhadores. Fazer uma brusca retirada de desonerações em momento de crise econômica aguda pode ser traumático e desorganizar os segmentos afetados.
O Simples Nacional, que atende pequenas e médias empresas, responde por mais de 50% dos benefícios. O subsídio dado ao Microempreendedor Individual custou foi criado para estimular a inclusão de trabalhadores autônomos de baixa renda no regime da Previdência (Lei 12.470/2011). Para os beneficiários, a alíquota de contribuição ao INSS é reduzida a 5% do salário mínimo. Assim, a redução ou extinção de ambas as renúncias é o mesmo que aumentar impostos pagos por micro e pequenas empresas e MEI.
Mas é importante ressaltar que, com o passar do tempo, as renúncias de receitas, em seus montantes atuais, perdem relevância. A despesa vai crescer tão rápido, em função do envelhecimento da população, que a participação das renúncias no déficit total tende a encolher.
Ou seja, reduzir as renúncias é importante, a reforma da previdência propõe isso. Mas só isso seria insuficiente e irrelevante para a solução do problema no médio e longo prazo. As demais renúncias de receita poderão ser aperfeiçoadas por meio de projetos de lei. Contudo, as mudanças nas renúncias não substituem a necessidade da reforma. Para garantirmos uma Previdência Social sustentável, as regras do sistema precisam mudar.
25) O déficit só apareceu por causa da recessão, basta a economia voltar a crescer que a Previdência se reequilibra
O desequilíbrio da previdência é estrutural: a despesa cresceu muito mais que a receita mesmo nos anos de maior crescimento econômico e só vai piorar ao longo do tempo com o envelhecimento da população. A retomada do crescimento pode melhorar a arrecadação da previdência, mas não vai impedir a tendência demográfica do envelhecimento e o consequente aumento da despesa com aposentadorias.
O Brasil já gasta com previdência 13% do PIB e só tem 13% de idosos na sua população. O Japão, por exemplo, gasta os mesmos 13% do PIB, mas sua população de idosos equivale a 48% da população total. O Brasil está envelhecendo muito rápido: em 2050, um em cada três brasileiros serão idosos. Mantida a taxa atual, o envelhecimento da população brasileira será mais de duas vezes mais rápido que a média mundial.