Uma sentença e uma liminar obrigam o órgão a pagar, durante o período de pandemia, salário-maternidade
Empregadores de gestantes afastadas do trabalho em decorrência da pandemia, com base na Lei nº 14.151, de maio, têm conseguido na Justiça repassar a conta ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Uma sentença e uma liminar obrigam o órgão a pagar salário-maternidade às funcionárias neste período de emergência.
A discussão envolve empregadas que não podem exercer seu trabalho a distância. A norma obriga o empregador – pessoa física ou empresa – a manter o salário integral das funcionárias.
Recentemente, uma empresa que presta serviços de atendimento médico de emergência a hospitais obteve sentença favorável na 14ª Vara Cível Federal de São Paulo. A decisão obriga o pagamento de salário-maternidade a enfermeiras gestantes.
A empresa alegou que seria impossível prestar serviços de enfermagem a distância e teria que contratar outros profissionais. Afirmou ainda que, de acordo com a Constituição, é dever do Estado garantir o direito à vida, à maternidade, à gestante e ao nascituro.
Ao analisar o caso, a juíza Noemi Martins de Oliveira, da 14ª Vara Cível Federal de São Paulo, entendeu que a Lei nº 14.151/21 não definiu a quem compete o pagamento da remuneração da trabalhadora gestante se a atividade profissional for incompatível com o trabalho a distância (processo nº 5006449-07.2021.4.03.6183).
Ela ainda levou em consideração o direito constitucional à saúde e o princípio da solidariedade, que embasa o dever coletivo da sociedade de financiar a Seguridade Social. “Não pode a empregadora ser obrigada a arcar com os encargos, na impossibilidade do exercício da profissão ocasionada pela crise emergencial de saúde pública”, diz.
A advogada da empresa, Rafaela Calçada da Cruz, sócia do Pereira do Vale Advogados, afirma que, em meio à crise, não dá para a empresa arcar com o pagamento da empregada em casa. “Está mantido o direito da funcionária e a empresa pode se valer do benefício previsto na legislação previdenciária. É um grande trunfo, amortiza muito o prejuízo que a empresa teria”, diz.
Recentemente, a advogada Débora Salvetti Pezzuol também obteve decisão favorável. Uma liminar no Juizado Especial de São Paulo para que o INSS seja obrigado a pagar salário-maternidade à babá de sua filha.
Débora contratou a profissional em janeiro. Em maio, foi editada a lei, determinando o afastamento. A babá está agora com 16 semanas de gestação. “Essa lei é um pouco arbitrária ao transferir para o empregador todo o risco, no caso de funções incompatíveis com home office”, afirma.
No pedido, ela destacou que o INSS já paga licença-maternidade antecipada para gestantes em atividades insalubres, como previsto no parágrafo 3º do artigo 394-A da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), incluído pela Lei nº 13. 467/17 (reforma trabalhista).
Para Débora, o mesmo deveria ocorrer nessa situação de pandemia. “Os empregadores domésticos, principalmente, ficaram sem alternativa com essa nova lei. Ir para a Justiça foi a única forma de obter esse resguardo”, diz.
A advogada ainda afirma que a Convenção nº 103 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que trata do amparo à maternidade, diz que o ônus, para evitar a discriminação da mulher no ambiente de trabalho, deve ser arcado pelo Estado.
Ao analisar o caso (processo nº 5003320-62.2021.4.03.6128), o juiz Jose Tarcisio Januário, da 1ª Vara Federal de Jundiaí (SP), afirmou que a situação é semelhante à prevista no parágrafo 3º do artigo 394-A da CLT. E que a legislação prevê que esse ônus pode ser repassado ao INSS, o que foi confirmado pelo Supremo Tribunal Federal na ação direta de inconstitucionalidade (ADI) 5938.
Essas decisões, segundo Mayra Palópoli, do Palópoli & Albrecht Advogados, trazem mais uma alternativa aos empregadores. Ela afirma que muitos de seus clientes optaram por suspender o contrato, como prevê a Medida Provisória nº 1.045, de 2021. Nesses casos, quando a funcionária voltar da licença-maternidade, ainda terá estabilidade a mais pelo período de suspensão.
“Essa lei que determinou o afastamento acaba gerando discriminação, uma vez que empregadores vão optar por contratar homens. Com essas decisões, o ônus é transferido para a coletividade”, diz.
Além da suspensão do contrato, Rafaela da Cruz afirma que empresas também têm adotado antecipação de férias e banco de horas. Mas, acrescenta, são soluções transitórias e oneram as empresas.
Procurado, o INSS informou que não comenta casos sub judice. A Advocacia-Geral da União não deu retorno até o fechamento da edição.