REFORMA TRABALHISTA IMPLICARÁ EM MUDANÇAS PROFUNDAS NA CONDUTA E NAS RELAÇÕES INTERNAS DAS EMPRESAS

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05 de Maio de 2017


REFORMA TRABALHISTA IMPLICARÁ EM MUDANÇAS PROFUNDAS
 NA CONDUTA E NAS RELAÇÕES INTERNAS DAS EMPRESAS

A Justiça do Trabalho continuará resistindo. Novas normas são mais para conter intervenções da  JT do que mudar a CLT.  Os muitos reflexos da reforma que devem ser discutidos dentro das empresas, e mudar condutas e regulamentos. 
O que se deve fazer doravante
 

A reforma trabalhista ainda deve ser aprovada no Senado e sancionada pelo presidente da República para começar a vigorar. Depois precisa passar pelas interpretações da Justiça do Trabalho. Nada impede que façamos reflexões sobre suas normas, pela grande probabilidade de que venham a vigorar, além de propiciar possíveis intervenções no Senado.

Há quase uma década, afirmamos, o problema não é a CLT que recebe tantas atenções, mas as interpretações e a cultura em vigor na Justiça do Trabalho, seu viés antiempresarial. Esse erro de foco dos críticos à situação na área tem dificultado a aprovação da reforma.

Não obstante todos divulgarem que o projeto de reforma trabalhista está focado na alteração da CLT, uma visão mais atenta mostra que ele a conter a judicialização das relações de trabalho, a intervenção cada vez mais criativa (no sentido negativo), agressiva, constante e insuportável da JT, os custos, insegurança, o temor de empregar e ter que enfrentar ações, o estímulo ao litígio – único nessas dimensões em todo o Planeta. Também relevante é a importância dada à regulamentação de novas atividades (home office etc.).  Só depois temos alterações de fato na CLT.

Há anos a Cebrasse divulga que o maior problema é a cultura prevalecente entre os juízes, não a CLT que poderia ser interpretada de forma mais moderna, aberta, com equilíbrio entre equidade e hipossuficiência, preocupação com fortalecimento das empresas (como ter empregos, riquezas crescentes, divisas, produtos e serviços, sem empresas?), estímulo a investimentos etc.

Também divulga também que na raiz do crescimento das reclamações estão propósitos corporativistas, conscientes ou não, dessa área do Judiciário. Como exemplo, temos citado sua aversão a toda solução extrajudicial dos litígios, o que as demais áreas do Judiciário estimulam.

Na Justiça do Trabalho não valem arbitragem e mediação independente, comissões de conciliação prévia, rescisões no Ministério do Trabalho ou no sindicato do trabalhador, e a definitiva tem que ser feita perante o Todo Poderoso Juiz, semideus, como se o trabalhador, mesmo assistido pelo sindicato e advogado, fosse sempre ignorante, dependente e hipossuficiente, e a empresa fosse mal intencionada.  Se houve uma radicalização inesperada na reforma, com cláusulas restringindo direitos dos trabalhadores, isso se deve a radicalização na conduta da JT.

Essa cultura não acabará de um dia para o outro. A JT continuará enfrentando e distorcendo a mensagem do legislador. A reforma é só o primeiro passo. Tem valor efetivo, pois coloca a JT na defensiva. Agora é questão de insistir e continuar a exigir redução de suas funções. A meta passa a ser de admissão de reforma pelo Legislativo e a admissão pelo Judiciário.

Benefícios ao trabalhador

Diversos itens poderão prejudicar o trabalhador nos primeiros tempos da imposição da reforma, devem ser observados criticamente, a realidade deve mudar com o desenvolvimento. Sem trabalhador bem pago e motivado inexiste desenvolvimento, paz social, mão de obra qualificada, construção de nação. Agora mais que nunca, o desenvolvimento é responsabilidade que o setor empresarial deve assumir.

Não faltam na reforma itens que irão beneficiar o trabalhador. Um exemplo: empresas cortaram prêmios, bônus etc., porque incorporavam os salários. Eles voltarão. Se a empresa vai bem, dá o bônus. Se vai mal, o restringe, como é natural. Se houver acordo coletivo, o intervalo de almoço pode ser de meia hora e todos saem meia hora antes do atual fim do expediente, chegam a suas casas mais cedo via transportes mais vazios e em menor tempo.

A empresa não permitia que o trabalhador ficasse em suas dependências no intervalo intrajornada ou após o fim do expediente, mesmo que  fosse para descansar, fazer um evento, estudar ou porque estivesse chovendo; esperando o horário do ônibus ou do cinema, pois “eram horas à disposição do empregador”. Agora pode.

Outro benefício que muitas empresas tinham cortado era o transporte do trabalhador, vez que as horas in itinere eram consideradas trabalhadas. Com a alteração, os transportes voltarão a circular. Outra norma aumenta a multa para o empregador que mantiver trabalhador sem registro.  Os denunciados abusos certamente serão punidos.

Considere-se como relevante também a valorização da convenção e do acordo coletivo, tanto quanto a previsão de representantes e comissões intersindicais, com garantia de seus membros contra despedidas sem justa causa ou os estímulos a decisões por assembleias .

No entanto, os maiores benefícios deverão advir do desenvolvimento econômico. O trabalhador, que atualmente corre de porta em porta pedindo desesperadamente  por emprego, pode voltar a ser disputado pelas empresas e, consequentemente, disputar maior remuneração e benefícios.

O reconhecimento de obviedades e tratamento diferencial das filantrópicas

Certas imposições da reforma são reconhecimento de obviedades. Por exemplo, o empregador poderia exigir jornada maior do trabalhador em situações excepcionais, mas teria que avisar o Ministério do Trabalho 10 dias antes. Ora, na maioria das vezes em que isso acontece (em razão de calamidades públicas, eventos não esperados, enchentes, incêndios e outras circunstâncias etc.) é por fato inesperado. Como avisar dez dias antes? A reforma acaba com essas e outras situações inaceitáveis.

Outras normas protegem micro e pequenas empresas e entidades filantrópicas.  As primeiras terão o depósito recursal reduzido à metade. Muitas, aliás, engoliam sentenças injustas e de valores delirantes, preferindo fechar as portas porque não tinham como recorrer. As filantrópicas sequer precisarão fazer o depósito.

Quanto a essas, há que se seguir adiante, proibindo a desconsideração da pessoa jurídica e que seus dirigentes tenham bens penhorados. A JT ameaçava acabar com essas entidades, ONGS ambientalistas, educacionais, de idosos, crianças, religiosas, santas casas, etc. Muitos voluntários não tão éticos  trabalham alguns meses e depois pedem vínculo, que são  reconhecidos pela JT. Quando a ONG não paga, dá-se a desconsideração da pessoa jurídica. O diretor, ele sim um samaritano doador de seu trabalho e de sua vida a uma obra caritativa, é responsabilizado.  

Tratamento diferenciado de empregados diretos, de terceirizados, trabalhadores temporários, trabalhadores intermitentes

Poderá haver diferença no tratamento desses trabalhadores, quanto à remuneração e benefícios? Eis aí algo que dificilmente a JT aceitará.

Pelo PL aprovado na Câmara pode haver o mesmo tratamento para esses trabalhadores, no caso de condições de higiene, segurança e salubridade. No entanto, os contratados para o trabalho temporário ou intermitente empregados em empresa de trabalho temporário também devem ter acesso a atendimento médico e ambulatorial e refeições disponíveis tanto como os empregados diretamente na empresa. Esses benefícios são apenas facultativos ao terceirizado.

Os juízes têm os fortes argumentos constitucionais da isonomia, da dignidade humana , da vedação da discriminação ou mesmo do salário igual para trabalho igual, para se opor a essas diferenças de tratamento.

Ações em andamento no STF e reclamações na Justiça do Trabalho

As ações que questionam decisões da JT no STF deverão persistir. É isso o que pleiteiam os profissionais de nosso escritório Maricato Advogados, fundamentando suas petições no fato de que a lei vale para frente e decisões do STF podem ter efeitos retroativos, ou seja, anular multas, sentenças etc. que proibiam, por exemplo, a atividade- fim, a ultratividade e demais arbitrariedades. Por outro lado, declaradas inconstitucionais essas interpretações, ficará mais difícil vê-las retornarem em novas decisões da JT. 

Quanto às demais reclamações, versando sobre situações reguladas pelo projeto de lei, se esse for aprovado, passarão a ser decididas conforme a situação em que se encontram. Para muitos juízes, até mesmo as situações vividas antes de lei entrar em vigor, serão protegidas pelo instituto do Direito adquirido e pela não retroatividade da lei. Com mais razão, os casos a serem julgados em reclamações iniciadas. Já quanto às que alteram normas processuais devem ser aplicadas de imediato

JT na defensiva

Pela primeira vez nos últimos anos, a JT está na defensiva. Sua força vem crescendo há muitos anos, deu um salto quando os vogais foram extintos e o juiz trabalhista adquiriu status de magistrado, na segunda instância de desembargador e no TST de ministro. O orçamento passou a crescer a ponto de passar as demais áreas do Judiciário, com novos direitos reconhecidos a cada ano: dano moral, dano social, dano existencial, assédio moral, assédio social, responsabilidade objetiva, reconhecimento de danos em ações coletivas etc., além da visão cada vez mais generalizada do trabalhador como hipossuficiente, multiplicaram as reclamações, até que chegamos a milhões por ano.

Conflitos com JT continuarão, reduzindo-se aos poucos

Apesar da reforma, acrescente-se as diversas intervenções do STF com visível enfraquecimento da JT, os conflitos continuarão em número muito acima do razoável.

Algumas das normas da reforma não serão obedecidas pelos juízes, que usarão  outras da Constituição para fundamentar decisões em sentido contrário: preservação da dignidade de trabalhador, direito à saúde, à segurança, proteção à maternidade, duração do trabalho não superior a 44 horas semanais, principio da proporcionalidade e da razoabilidade e direito ao trabalho,  além de convenções internacionais.

À da arbitragem, por exemplo, ou de validade da rescisão fora da JT oporão a previsão constitucional do direito do acesso ao Judiciário. Haverá resistência à aceitação da prescrição intercorrente, à que restringe a desconsideração da pessoa jurídica, à limitação do dano moral, entre outras.

Algumas poderão ser interpretadas até contra empresas, como a que prevê sucumbência. As reclamações podem se tornar mais caras para as empresas.

No entanto, com o tempo e continuidade dessa luta, tenderão a se reduzir, assim como aumentará a segurança jurídica. Tudo isso acontecerá tanto mais rapidamente quanto o empresariado ajudar no que se espera com a reforma: na retomada do desenvolvimento econômico, na geração de empregos, no uso do “espírito animal”. 

Fortalecimento dos sindicatos

Os sindicatos perdem pontos devido às regulamentações detalhadas do PL, mas, pelo menos os autênticos, devem se fortalecer com a valorização da convenção. Essa passa a valer em vários itens, e não a opinião do Juiz do Trabalho que muitas vezes, mesmo desconhecendo a realidade vivida, impunha a empregadores e trabalhadores sua decisão. Empresários e trabalhadores comparecerão com muito mais frequências às assembleias, reuniões, discutindo com mais interesse as cláusulas possíveis. Os sindicatos terão participação nos acordos, previstos em muitas cláusulas, nas comissões sindicais internas, nas assembleias por empresa.

O fim da contribuição, se ocorrer, ajudará a liquidar entidades de fachada. As que sobrarem serão mais fortes, Há que se considerar, no entanto, que essa norma do PL pode ser alterada no Senado ou vetada pelo presidente. Há também probabilidade de aprovação de emenda, para que ela só seja implantada após certo número de anos, para que os sindicatos possam se preparar para a nova realidade, o que é mais razoável.

Há muito por fazer

No momento, trata-se de obter a aprovação da reforma também no Senado, e pensar em avançar.  Cabe a advogados principalmente, mas também a entidades, parlamentares, diversas vozes da modernização, continuar o combate pela equidade, pelo atendimento da letra e do espírito da lei, da reforma, fazendo correções de rumo nas que podem levar risco ao trabalhador, se de fato acontecerem.

Outro ponto a ser discutido é o custo dessa área especializada da justiça, para o erário: mais de R$ 20 bilhões.  Juízes e membros do Ministério Público do Trabalho (MPT) ganham muito acima do teto: nada menos que R$ 33 mil (diga-se a bem da verdade que ocorre em todas as áreas do Judiciário), e há diversas outras distorções.  

Insta acrescer que o papel do MPT é muito semelhante ao do Ministério do Trabalho, os procuradores fazem o mesmo que os fiscais: buscam irregularidades nas relações de trabalho. E custam muito mais caro. Por que duas instituições para fazer a mesma coisa? 

Adequação e conduta das empresas; o que delas se espera; abusos de empresas serão punidos

Há muitas questões em aberto e que poderão merecer diversas interpretações. Varias delas necessitam regulamentação. É certo, porém, que abusos por parte das empresas também serão punidos com rigor por juízes, e dificilmente encontrarão quem as defenda perante a opinião pública. Haverá pontos polêmicos na interpretação da exploração da flexibilidade das jornadas de trabalho, no trabalho intermitente, na manutenção de grávidas em ambientes insalubres, de qualquer tipo e em outros pontos da reforma trabalhista.

Recomenda-se que todas as empresas façam palestras, debates, regulamentações sobre interpretação e imposição das novas normas, com ciência de todos os trabalhadores, em especial de advogados e equipes de Recursos Humanos. Essa conduta poderá evitar muitos conflitos com trabalhadores, reclamações trabalhistas, dano à imagem junto à sociedade, denúncias de sindicatos, fiscalizações, penalidades por dano social e outras situações.

As empresas devem corresponder não só atendendo a expectativa de aumento da produção e empregos, mas também interpretando as novas normas em benefício de todos, inclusive trabalhadores, o País, a sociedade, partilhando benefícios, lucros, excedentes, produzindo mais, com melhor qualidade, maior variedade, menores preços. É o caminho para provar que o empresariado estava certo quando reivindicou mudanças, e para conseguir mais.

Elaborado por Percival Maricato, vice presidente jurídico da CEBRASSE, sócio do Maricato Advogados Associados

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