Quem é Ciro Nogueira, ex-lulista que será principal ministro de Bolsonaro

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Quem é Ciro Nogueira, ex-lulista que será principal ministro de Bolsonaro

A Casa Civil é considerada a pasta mais importante porque tem a função de coordenar o trabalho dos demais ministérios e a gestão administrativa e política do governo federal

“(Ao Jair) Bolsonaro, eu tenho muita restrição. Ele tem um caráter fascista, preconceituoso.” Essa foi a avaliação do senador Ciro Nogueira (PP-PI) sobre o então deputado federal e futuro presidente, feita em 2017 durante entrevista à TV Meio Norte.

Na mesma ocasião, o parlamentar declarou que apoiava a eleição de Luís Inácio Lula da Silva em 2018, acrescentando que o petista “foi o melhor presidente deste país, especialmente para o Piauí e o Nordeste”.

Quatro anos depois, Bolsonaro decidiu trazer Nogueira para o coração do seu governo.

O senador e presidente do Partido Progressistas (PP), um dos maiores do Centrão, bloco de legendas que hoje dá sustentação política ao presidente, assumirá a Casa Civil com a missão de melhorar a articulação política do Palácio do Planalto e afastar ainda mais as ameaças de impeachment.

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A Casa Civil é considerada a pasta mais importante porque tem a função de coordenar o trabalho dos demais ministérios e a gestão administrativa e política do governo federal.

Nogueira é do mesmo partido e atua em sintonia com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), o homem que pode dar início ou não a um processo contra Bolsonaro e hoje é seu fiel aliado.

O próprio presidente já confirmou publicamente a escolha de Nogueira e o aceite do senador, mas a nomeação deve ser oficializada só na segunda-feira (27/7), após uma reunião com Nogueira no Palácio do Planalto.

“É uma pessoa que conheço há muito tempo, ele chegou em 1995 na Câmara, eu cheguei em 1991. Fui mais da metade do meu tempo de parlamentar, fui do Progressistas, partido do Ciro. Então é uma pessoa que nos interessa pela sua experiência, que pode fazer um bom trabalho aqui”, disse Bolsonaro em entrevista para a Rádio Banda B.

Nogueira vai substituir o general da reserva Luiz Eduardo Ramos, que, por sua vez, deve ser deslocado para a Secretaria-Geral da Presidência, hoje sob comando de Onyx Lorenzoni (DEM).

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A expectativa é que Lorenzoni chefie o Ministério do Emprego e da Previdência, novo nome da pasta do Trabalho, que havia sido incorporada por Bolsonaro ao Ministério da Economia, de Paulo Guedes, e será recriada.

Com isso, o governo passará a ter 23 ministérios, na contramão da promessa de Bolsonaro de reduzir o número de pastas — na campanha, ele disse que seriam 15 e, quando assumiu, tinha 22.

A trajetória de Nogueira

Uma vez confirmada, a nomeação do senador para a Casa Civil consolidará ainda mais a aliança de Bolsonaro com o Centrão — grupo de partidos de centro e centro-direita que tende a apoiar governos de diferentes ideologias, em busca de espaço na máquina pública e recursos para suas bases eleitorais.

A escolha, que pode parecer incoerente para ambas as partes, revela o pragmatismo de Bolsonaro e Nogueira.

O presidente foi eleito com duas críticas ao “toma lá, dá cá” da troca de cargos por apoio político. Acuado por dezenas de pedidos de impeachment, porém, iniciou há cerca de um ano sua aliança com o Centrão para proteger seu mandato, abrindo espaços para indicações desse grupo na máquina federal e destinando mais recursos da União para as bases eleitorais desses parlamentares.

Nogueira apoiou todos os governos desde que chegou à Brasília pela primeira vez como deputado-federal do PFL em 1995. Esteve na base de Fernando Henrique (PSDB), Lula (PT), Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB).

Mesmo crítico a Bolsonaro, se tornou um dos seus maiores apoiadores no Congresso. Em troca, tem conseguido levar mais investimentos federais a seu Estado, o Piauí, e agora ocupará um dos cargos mais importantes do governo federal.

Ciro Nogueira é pré-candidato ao governo do Piauí, onde hoje é oposição ao governador petista Wellington Dias. Dentro desses planos, fez sentido para ele se afastar de Lula nos últimos anos e buscar uma aliança com Bolsonaro.

Caso sua candidatura se confirme, terá como principal concorrente alguém apoiado por Lula e Dias, possivelmente o secretário estadual de Fazenda, Rafael Fonteles (PT).

A boa relação com o Planalto tem rendido a Nogueira uma boa fatia na distribuição das chamadas “emendas do relator”, mecanismo que foi criado no Orçamento da União pela primeira vez em 2020 e reserva alguns bilhões de reais para os parlamentares destinarem a suas bases eleitorais. Os mecanismos de distribuição, porém, não têm qualquer transparência ou critérios objetivos.

Segundo reportagem de maio do jornal Estado de S. Paulo, veículo que teve acesso a uma planilha do governo com a distribuição de parte desses recursos, Nogueira pôde escolher a destinação de R$ 135 milhões do orçamento do Ministério do Desenvolvimento Regional somente em dezembro de 2020.

“Ele precisaria de 16 anos no Senado para poder indicar tamanha quantia, se contasse apenas com as emendas individuais (de parlamentar) — a cada ano, apenas R$ 8 milhões são disponíveis para livre indicação por parlamentares, sendo que um valor semelhante é possível de indicar apenas dentro da área da saúde”, destacou ainda a reportagem do jornal.

O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), órgão comandado por um indicado de Nogueira — Marcelo Lopes da Ponte, ex-chefe de gabinete do senador — recebeu R$ 1,5 bilhão das emendas de relator em 2020, segundo o jornal O Globo.

A aliança com Bolsonaro também permitiu a Nogueira aumentar sua influência no Judiciário. Foi ele o principal padrinho da primeira indicação do presidente ao Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Kassio Nunes Marques, que também é do Piauí.

Alvo da operação Lava Jato

Se o governo Bolsonaro começou com o maior símbolo da Operação Lava Jato, o ex-juiz Sergio Moro, como ministro, agora terá no cargo mais importante da Esplanada dos Ministérios um dos alvos da mesma operação.

Ciro Nogueira já foi denunciado quatro vezes pela Procuradoria-Geral da República (PGR), sendo que duas delas foram rejeitadas pela Segunda Turma do STF e outras duas ainda aguardam análise.

Em agosto de 2018, a denúncia que acusava o senador de corrupção passiva e lavagem de dinheiro por supostamente pedir R$ 2 milhões em 2014 ao então dono da construtora UTC, Ricardo Pessoa, foi rejeitada porque os ministros consideraram não haver provas além da palavra do próprio executivo, em acordo de delação premiada.

Já em março uma denúncia contra o senador e outros parlamentares do PP por crime de organização criminosa foi considerada inepta por tratar de acusações já arquivadas em outros inquéritos.

Em outra denúncia da PGR, o senador é acusado de tentar atrapalhar a investigação da Lava Jato ao tentar comprar o silêncio de um ex-assessor.

Há dois votos na Segunda Turma do STF para tornar Nogueira réu (ministros Edson Fachin e Cármen Lúcia), mas o julgamento foi interrompido em 2018 por pedido de vista do ministro Gilmar Mendes e ainda não foi retomado.

Ciro Nogueira foi denunciado também em fevereiro de 2020, acusado de favorecer o grupo Odebrecht com sua atuação parlamentar em troca de propina de R$ 7,3 milhões. O caso aguarda julgamento.

O senador nega todas as acusações.

“O senador Ciro Nogueira foi colocado sob foco de investigação num momento no qual havia, claramente, uma tendência de criminalização da política. Uma estratégia vulgar adotada pela tal Operação Lava Jato e que já foi condenada pelo Supremo Tribunal”, disse por meio de nota seu advogado, Antônio Carlos de Almeida Castro, conhecido como Kakay.

“As primeiras denúncias apresentadas formalmente contra o senador Ciro Nogueira perante o Supremo foram completamente rechaçadas pela Corte, que tem se posicionado firmemente contra os excessos nas delações e contra essa criminalização da política. Claro que ninguém está acima da lei, e todos podem e devem ser investigados. Mas não há, em nenhum dos inquéritos em trâmite no Supremo Tribunal Federal, qualquer coisa que preocupe a defesa”, disse ainda o advogado.

Desafios do novo ministro

Nogueira chegará ao Planalto em um momento de baixa popularidade do governo, em que o presidente está acuado por denúncias de supostas ilegalidades em contratos para compra de vacinas — que Bolsonaro nega.

Entre os primeiros objetivos que terá pela frente, está a aprovação no Senado das indicações do advogado-geral da União, André Mendonça, para o STF, e do procurador-geral da República, Augusto Aras, para um novo mandato de dois anos no cargo.

Além disso, Nogueira terá que construir uma solução para a crise do fundão eleitoral de R$ 5,7 bilhões aprovado pelo Congresso para financiar campanhas de 2022 e que deve ser vetado por Bolsonaro.

Outro desafio é tentar reduzir o desgaste do governo com a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid — objetivo difícil de ser alcançado, já que a ida do senador do PP para a Casa Civil não vai alterar a composição da CPI, em que os parlamentares governistas — entre eles, o próprio Nogueira, é o membro-titular — são hoje minoria.

A comissão retoma seus trabalhos em agosto, após o recesso parlamentar, e foi prorrogada por mais 90 dias.

Mãe de Ciro Nogueira assume em seu lugar

Com a nomeação para a Casa Civil, quem assumirá o lugar de Ciro Nogueira no Senado é sua mãe, Eliane Nogueira, a primeira suplente de seu mandato.

Como é comum no Brasil, o senador vem de uma família com tradição na política, embora sua mãe especificamente nunca tenha sido parlamentar antes.

Seu avô paterno, Manuel Nogueira Lima, foi prefeito de Pedro II, no Piauí, nos anos 1930. Já o pai, Ciro Nogueira Lima, foi duas vezes deputado federal.

O senador foi casado por 25 anos com Iracema Portela Nunes Nogueira Lima, também de uma família tradicional na política, com quem teve duas filhas.

Seu ex-sogro, Lucídio Portela Nunes, foi governador do Piauí de 1979 a 1983 e depois senador. Sua ex-sogra, Míriam Portela Nunes, foi parlamentar constituinte e deputada federal.

Advogado e empresário, Nogueira teve um forte ganho patrimonial em oito anos, segundo suas declarações de bens ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Em 2010, ele informou possuir R$ 1,9 milhão em investimentos, automóvel e participação em empresas no Piauí. Já em 2018 declarou patrimônio de R$ 23,3 milhões, valor que incluía ainda um imóvel e uma aeronave.

O maior ganho veio do aumento do valor declarado pela empresa Ciro Nogueira Comércio de Motocicletas, que saltou de R$ 809,8 mil para R$ 18,8 milhões.

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