DÚVIDAS E CERTEZAS
Projetos de lei e ação judicial no STF podem tomar diversos caminhos
Um PL sobre a terceirização já se tornou lei e está em vigor. Congressistas e membros do Executivo ainda falam em aprovar outro ou emendas na reforma trabalhista que reduzam a precarização do emprego. Quando perguntados, ninguém consegue dizer que precarização é essa. Por sua vez, continua no STF uma ação judicial cujo pedido é declarar inconstitucional a Súmula 331 do TST, que proíbe a terceirização na atividade fim. Aparentemente, essa ação perdeu o objeto, já que agora há lei nesse sentido. No entanto, deve ser julgada e, se considerada ilegal a Súmula 331, a decisão poderá influenciar em muitas ações em andamento e fundamentar rescisórias, anulando condenações de empresas. Entendemos que, no mínimo, a ação na Suprema Corte deve ser julgada, tendo em vista o direito de sua autora – que foi multada por ter feito terceirização da atividade-fim. Uma declaração de inconstitucionalidade permite questionamento sobre a multa astronômica aplicada pela Justiça do Trabalho. Se o Senado aprovar outro projeto de lei ou dispositivos contraditórios com a lei em vigor, na reforma trabalhista, voltaremos a ter insegurança jurídica, reclamações, fuga de investimentos etc. Existindo duas normas contraditórias, as interpretações deveriam ser feitas com observação do conjunto formado e suas intenções de forma lógico-sistemática ou priorizando a lei mais antiga. Porém, se o julgamento for sobre relações de trabalho, a Justiça do Trabalho é competente e irá priorizar a mais benéfica ao trabalhador – com base em princípios que regem sua atividade, hipossuficiência, etc. A ação no STF Uma decisão declaratória de inconstitucionalidade da Súmula 331 teria implicações em milhares de procedimentos judiciais e administrativos em curso. A lei vigora na data que for publicada ou determinada explicitamente por ela mesma, para frente, mas a decisão de inconstitucionalidade da súmula 331 teria reflexos nas fiscalizações, reclamações e multas – até mesmo as já pagas. Por sua vez, se o voto do STF for pela constitucionalidade da súmula, nada acontecerá de negativo, pelo menos se não houver alterações na lei em vigor. O Estado não é responsável subsidiário por débitos trabalhistas das terceirizadas O STF também decidiu que o Estado não tem responsabilidade objetiva por descumprimento de legislações trabalhistas de prestadoras de serviços. Pode ser responsável em dois casos: se não contratar corretamente ou não fiscalizar. No primeiro caso, o que se espera é que faça licitação idônea. Admitir empresa que não preenche requisitos legais (informais etc.) não é contratar idoneamente. Muito menos contratar por preço inexequível. Quando a fiscalizar a aplicação trabalhista pela terceirizada, pagamento de encargos, também é dever do Estado. A prova de que esses deveres não foram cumpridos é de quem reclama. Só essa decisão acaba com mais de 50 mil reclamações trabalhistas. Nessas, os reclamantes irão se voltar com mais energia contra as empresas inadimplentes e seus sócios ou até seus ex-sócios. |
JUSTIÇA DE PAÍS RICO EM PAÍS POBRE –
AS CONSEQUÊNCIASO Brasil ainda é um país pobre, com renda média reduzida, com números do FMI apontando que seu PIB per capita deve atingir US$ 18 mil em 2020, subdesenvolvido ou emergente, como se costuma dizer mais modernamente, em especial se comparado a países desenvolvidos. Deveria facilitar a produção de bens e serviços, mas suas normas e órgãos públicos fazem o contrário: dificultam, colocam obstáculos, encarem atividades. Pelo acórdão abaixo, a Justiça do Trabalho condenou um hospital do interior em R$ 19 mil por danos morais a um único trabalhador, porque havia um só vestiário para homens e mulheres e ele, para não passar pelo vexame de ter que se trocar no mesmo local (que evidentemente poderia ser fechado nessa hora). Certamente os demais trabalhadores irão à Justiça do Trabalho pedir o mesmo tratamento, e muito provavelmente teremos o fim do hospital ou, no mínimo, desvio de verbas antes usadas em outras áreas prioritárias para construir vestiários. No mesmo sentido começaram condenações punindo empresas com valores elevados, porque o trabalhador se sente constrangido por ter que tomar banho em boxes abertos. Pelo mesmo raciocínio, sócios de clubes, times de várzea etc. deveriam pedir indenização, por “expor seus corpos” aos amigos. Adão e Eva também poderiam ter protestado. Em milhares de situações não se têm o ideal e sendo escassos os recursos faz-se o que se pode para produzir bens e serviços, melhorar a vida alheia. Se formos levar em conta que têm de ser atendidos sempre o ideal, o inatacável, a letra e forma da lei burocrática, detalhista, abstrata às vezes, não teremos nada – e em certas escolas, hospitais, serviços públicos e organizações beneficentes, o que é muito pior. Frise-se que este não é um problema apenas da Justiça do Trabalho. Outras áreas do Judiciário que tratam de consumidores, tributos, planos de saúde, estabelecimentos comerciais, clubes esportivos e restaurantes etc., fazem a mesma coisa. E nisso as leis corroboram, tudo fica detalhado, caro, mais sofisticado que nos países desenvolvidos. Assim, no Brasil, ou se faz empreendimentos sofisticados ou não se fazer nada. Azar de quem está carente ou pode pagar pouco. 6ª Turma: utilização de banheiro e vestiário coletivos em hospital configura dano moral 22 Março 2017 Uma enfermeira alegou passar por constrangimento quando trabalhava num hospital, já que não havia vestiário feminino ali, e o banheiro existente era compartilhado por cerca de 15 pessoas de ambos os sexos a cada plantão. Ela pediu indenização por danos morais; negada na sentença (1ª instância), a empregada recorreu, com outros pedidos. O hospital também recorreu sobre termos da sentença.
Os magistrados da 6ª Turma do TRT-2 julgaram os recursos. Sobre o pedido de indenização por danos morais, a relatora, juíza convocada Mylene Pereira Ramos, destacou que a própria testemunha da reclamada (hospital) assegurou que havia apenas um banheiro para uso misto; por isso, a autora já ia trabalhar uniformizada. Isso comprovou o desrespeito aos requisitos da Norma Regulamentadora (NR) 24, que versa sobre as condições sanitárias e de conforto no local de trabalho.
Conforme o acórdão, “o banheiro e vestiário de uso comum, por si só, expõe demasiadamente os empregados a situações vexatórias e degradantes. As circunstâncias em que a autora trabalhou são suficientes para configurar dano moral” – concedido e arbitrado em R$ 15 mil.
Os demais pedidos da autora foram negados, e também os da reclamada; portanto, foi dado provimento parcial ao recurso da primeira, e negado provimento ao recurso da segunda.
(Processo 0001073-29.2015.5.02.0445 – Acórdão 20160931040) – Texto: Alberto Nannini – Secom/TRT-2 |
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