REMOVENDO RESISTÊNCIAS, A REFORMA TRABALHISTA AVANÇA

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Boletim Jurídico - Informações que geram conhecimento
11 de Abril de 2018

REMOVENDO RESISTÊNCIAS,
A REFORMA TRABALHISTA AVANÇA

Como previsto, após um verdadeiro levante dos magistrados trabalhistas mais conservadores (a  ANAMATRA  chamou de inconstitucional e elaborou 125 “teses” contrariando seus objetivos),  a reforma trabalhista  (Lei 13.467/17) vai se consolidando. A maioria dos juízes, alguns timidamente, outros mais ousadamente, vão aderindo às normas de modernização. A resistência perdurará muitos anos, mas em grupos minoritários, sem apresentar os riscos que antes chegavam a desestimular o empreendedorismo.

Entre as  normas mais pacificadas estão as que  evitam ou pelo menos reduzem aventuras judiciais e consequentente o número de processos. São os casos em que acontece condenação em honorários ou por má fé, em custas judiciais ou de perícias. Reclamantes e advogados pensam duas vezes antes de ajuizar reclamações de duvidosa viabilidade. As que estão sendo propostas são mais sensatas, com valor mais próximo do razoável, contidas, sem delirio, não se faz dezenas de pedidos,  terminando por pleitear dano moral por que o gerente olhava feio para o reclamante. O número de ações, de pedidos em cada processo, o valor, o número de estoques de processos nas prateleiras, vão caindo. A médio prazo se poderá discutir o redimensionamento da Justiça do Trabalho, orçamento, prédios etc. No momento se pode arquivar os planos de expansão, que nas grandes cidades previa implantação de fóruns em bairros (em São Paulo dois foram implantados e tudo indica que poderão ser extintos). O ex presidente do TST, Yves Gandra Martins Fo, em evento em São Paulo, chegou a aventar até a dissolução da Justiça do Trabalho, se continuasse contrariando a lei e a sociedade.

Em decorrência está surgindo um outro aspecto positivo que já tínhamos aventado: com menos processos os magistrados dedicam mais tempo e atenção aos que lhes caem nas mãos, fazem sentenças mais bem elaboradas, logo mais teremos mais agilidade, prestação jurisdicional mais rápida e de melhor qualidade, beneficiando em especial o reclamante que faz pleitos justos.

Isto era praticamente inviável até o ano de 2017, quando um juiz tinha que  elaborar cinco sentenças por dia, além de dirigir cartório, fazer audiências etc. Espera-se que o mesmo ocorra nas instâncias superiores, tão logo os efeitos da redução de processos seja sentido nas cortes. As pressões corporativas se reduzirão. Haverá menos pressão por novos fóruns, contratação de mais juízes e funcionários, mais verbas etc.

Em resumo, o país, os reclamantes, as empresas, o Estado e a sociedade  terão menos despesas,  mais agilidade e mais qualidade. Os juízes se conformarão com os espaços que ocupam, desistirão de serem os redentores da questão social. Paradoxalmente, os juízes terão mais qualidade de vida, mais tempo para estudar seus processos, mais tranquilidade na hora de dar uma sentença.

Consequências do arquivamento da Medida Provisória que pretendia modificar a Reforma

O governo, tentando aprimorar alguns itens da reforma, enviou ao Congresso a MP 808, que, no entanto. acabou perdendo o seu prazo de vigência e caducou.

Entre as principais pretensões da MP estavam a de tornar mais seguras para os trabalhadores as regras da contratação pelo trabalho intermitente, só permitir a jornada 12 x 36 por contratação coletiva,  permitir afastamento de gestantes e lactantes do trabalho insalubre,  regulamentar de forma mais adequada o dano extrapatrimonial (moral), permitir que autônomos prestassem serviços sem exclusividade. Extinta a MP, voltam a valer as normas anteriores, para o bem e para o mal.

A maior perda com o arquivamento da MP do lado empresarial foi pelo seu artigo 2°, onde se lia que a lei da reforma trabalhista aplicava-se em sua integralidade a todos os contratos vigentes. Isto seria desnecessário em qualquer outra área da justiça, pois há normas que regulam a aplicação de novas leis, mas no caso da Justiça do Trabalho o reforço seria bem vindo, reduziria a insegurança jurídica e o excesso de judicialização. Haverá magistrados que insistirão em decidir que a reforma não vale para as reclamações ajuizadas antes dela entrar em vigor, ou até para contratos feitos antes dessa data.  Trata-se de um equívoco, uma forma de resistência dos magistrados conservadores, pois tanto a Lei de Introdução das Normas do Direito Brasileiro como o Código  Civil e o Código  de Processo Civil admitem que uma lei, especialmente as de cunho processual, passem a valer ao entrar em vigor. E nesse sentido se pronunciaram os juízes referidos quando da lei que aprovou o aviso prévio acrescido conforme anos de serviço: a lei deveria se aplicar em contratos já feitos e não dai para diante. Conforme a Constituição, o que deve ser respeitado é o direito adquirido, a decisão judicial transitada em julgado e o ato jurídico perfeito.  A insegurança persistirá por algum tempo, mas a tendência é que as normas da reforma sejam cada vez mais admitidas como válidas, mesmo as que condenam o vencido a pagar honorários ao vencedor. A validade definitiva das questões mais tormentosas serão decididas no final pelo  TST, as de fundo constitucional pelo STF.

Como ficam os contratos feitos durante a vigência da MP

Os contratos iniciados e concluídos durante a vigência da MP 808 poderão ser mantidos, se interessarem às partes, serem adaptados ou serem levados a Justiça do Trabalho por quem se julga prejudicado, trabalhadores ou empresas. Se levados ao Judiciário haverá decisões contraditórias sobre sua validade, pois a interpretação depende de teses diversas do direito intertemporal, de conteúdo material  e processual. Se o contrato foi feito durante a vigência da MP, devem prevalecer, serem válidos, mas e suas projeções no tempo, onde haverá outra lei em vigor? Se alguém contratou funcionários para a jornada 12 x 36 ou trabalho intermitente por acordo individual, pode manter o contrato.

O que pode acontecer nos próximos dias

Bom lembrar que toda reforma, especialmente por tão inesperada e verdadeiro abalo sísmico, demora para ser assimilada. Muitos empresários estão na expectativa de que se consolide decisões judiciais  nas questões mais tormentosas. O emprego não deslanchará tão só devido a reforma, mas certamente ela será uma das variáveis decisivas, multiplicadora, tão logo a economia reaja e se tenha segurança jurídica sobre os rumos da jurisprudência.

O governo tentará resolver por decretos e resoluções, ou novas MPs, os casos mais aberrantes, como o referido dano extrapatrimonial calculado com base em salário, evidentemente inconstitucional (fere princípios da equidade, razoabilidade, isonomia) ou o do trabalho da gestante. Haverá confusões, decisões contraditórias dos magistrados. Decretos e resoluções não valem tanto como lei e podem ser questionados; a matéria exige leis e constitucionais. Também deverá haver projetos de lei de iniciativa governamental ou parlamentar tentando mudanças mais substanciais, entre elas as previstas na falecida MP. Já se fala em pegar carona em outros projetos de leis, já existentes, para “consertar o conserto” .Do lado empresarial fala-se em acrescentar novas normas, não inseridas na reforma (tempo de validade para ajuizar reclamação, tempo de anos em que se  calcula os benefícios do reclamante). Os trabalhadores também não desistirão de seus pleitos, se bem que no momento ocupam-se muito mais com a questão da contribuição obrigatória. No momento litigam em 21 ações de inconstitucionalidade da reforma no STF, sobre: contribuição sindical; limites a indenizações; correção de depósitos; trabalho intermitente; e pagamento de custas. Com os julgamentos das ADINs, e consequente exame de constitucionalidade, as dúvidas e controvérsias deverão ser esclarecidas.

Menos convenções e mais acordos, coletivos e individuais

Outra tendência é de redução do número de convenções e multiplicação dos acordos, tanto coletivos como individuais. A lei que implantou a reforma trabalhista diz com todas as letras que acordo é superior a convenção. Por outro lado, há normas que prestigiam o acordo individual.  Como a referida MP caducou, o acordo individual teve seu prestígio devolvido; entre os que voltaram a valer está a possibilidade de contratar individualmente na jornada 12 x 36. Por outro lado, é nos acordos que os sindicatos tem recebido mais receptividade, inclusive de manutenção das contribuições, com os mesmos ou outros nomes.

 

PERCIVAL MARICATO, VICE-PRESIDENTE JURÍDICO DA CEBRASSE